Artigo Dominical de Dom Pedro José Conti, bispo de Macapá
Por Pascom
Um
rio, na sua tranquila corrida para o mar, chegou em um deserto e parou.
Diante de si, tinha somente pedras espalhadas por todo lugar e dunas
de areia a perder de vista. Ficou paralisado pelo medo. – É o meu fim –
pensou desesperado – nunca vou conseguir atravessar este deserto. A
areia vai engolir a minha água e eu vou desaparecer. Nunca mais chegarei
ao mar. Sou um rio fracassado.
Aos
poucos as suas águas começaram a ficar sujas. O rio estava virando lama
e estava morrendo. O vento, porém, tinha ouvido as suas lamúrias e
decidiu salvar-lhe a vida.
– Não tenhas medo, deixa que o sol te esquente. Tu vais subir ao céu na forma de vapor. Depois eu mesmo pensarei o restante.
Mas o medo do rio aumentava:
- Eu não sou feito para voar nos ares, eu devo correr entre as margens, líquido e majestoso.
O vento insistiu e explicou:
-
Quando chegares ao céu, vais te transformar numa nuvem. Eu te levarei
além do deserto e tu poderás cair novamente sobre a terra, na forma de
chuva, vais voltar a ser rio e vais chegar ao mar.
O rio, porém, teve mais medo ainda. Assim foi devorado pelo deserto.
Podemos
dizer isso de muitas formas, mas a nossa vida é feita de contínuas
transformações. Somos sempre a mesma pessoa, mas também mudamos. As
etapas da vida nos fazem passar pela infância, pela juventude, pela
idade adulta e, enfim, pela velhice. Os traços pessoais permanecem, no
entanto, às vezes, mudamos tanto que ficamos quase irreconhecíveis. As
maiores transformações, porém, não são as do nosso
corpo. Mudamos muito mais nas ideias, nos afetos, nos pensamentos, nos
sonhos e nas esperanças. O ser humano vive em transformação. É por isso
que queremos saber de onde viemos e para onde vamos.
Se
a vida é um caminho, para onde nos conduz? Podemos encontrar as
respostas escutando o que o Filho, Jesus, nos diz, dando ouvido e
acreditando
na voz do Pai que o enviou. A missão de Jesus foi a de nos fazer
conhecer o amor do Pai. Ele quis reconduzir a humanidade ao encontro com
Deus, numa nova aliança de amor. Deu atenção aos mais afastados, aos
mais sofridos, buscou as ovelhas perdidas. Desmascarou
uma religiosidade hipócrita feita de rigor exterior e sem coração.
Perdoou e não condenou os pecadores. Entregou totalmente a sua vida a
esta missão e pagou muito caro por tudo isso: foi morto na cruz. No
entanto abriu o único caminho possível para a verdadeira
transformação da vida pessoal de cada ser humano e do mundo inteiro: o
caminho do amor. Os apóstolos começaram a entender tudo isso somente na
manhã radiosa da Páscoa e ao anoitecer daquele dia quando o
reencontraram ressuscitado.
Cada
um de nós é chamado a dar um sentido às transformações que acontecem em
sua vida. Cada etapa é o fim de algo, mas pode ser
também um novo começo. Vale também para os acontecimentos da vida.
Alguns são esperados e preparados, outros nos pegam de surpresa e
devemos reaprender a conviver com a nova situação. Tudo, em nossa vida,
poderia – ou deveria – servir para nos tornar melhores.
Mais capazes de amar e sofrer; mais capazes de doar e aceitar ser
ajudados; mais capazes de confiar e ser confiáveis. Mais corajosos na
fé, mais firmes na esperança e mais generosos no amor. Mais felizes. Nem
sempre isso acontece. Muitas vezes mudamos para
pior. Ficamos mais egoístas, interesseiros, vingativos e rabugentos.
Sempre mais tristes e perdidos. É porque deixamos de prestar atenção e
acreditar naquilo que Jesus fez e ensinou. O caminho para a vida nova da
ressurreição passa pela subida ao Calvário,
tem que morrer um pouco todo dia ao nosso orgulho para deixar a paz do
Senhor tomar conta do nosso coração. “Somos cidadãos do céu” nos lembra a
carta aos Filipenses neste domingo.
Somos rios que devem correr para o mar, de transformação em transformação. Não somos feito para morrer nos desertos da vida.
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