Reflexôes de Dom Pedro José Conti, bispo de Macapá
Macapá - (PASCOM) Três
jovens africanos foram colocados na grande cabana das reuniões. O Chefe
da tribo estava sentado no fundo e aos seus lados estavam os velhos
guerreiros. O ancião tomou a palavra e disse:
-
Por seis dias vocês ficaram na floresta. Foram testados para ver se têm
capacidade de se defender dos mil perigos que a mata esconde. Voltaram
sãos e salvos, mas ainda não basta para serem
julgados verdadeiros guerreiros. O que fizeram para merecer este
título?
-
No meio do silêncio, os três jovens contaram os seus feitos. Um havia
matado uma onça, o outro, lutado contra uma cobra grande.
- E você, Mamadu, o que fez? – perguntou o Chefe.
- Peguei uma vasilha de mel das abelhas selvagens – respondeu baixinho Mamadu.
Os
jovens riram. Roubar mel das abelhas era só questão de paciência,
talvez um pouco de audácia, mas não era uma façanha digna de um
guerreiro.
- Por que você tirou o mel das abelhas e não foi caçar algum animal feroz? – perguntou o Chefe.
- O senhor sabe que os meus pais são velhos e doentes; devo cuidar deles, não podia deixá-los sem comida. Levei o mel para eles.
O Chefe levantou-se. Estendeu a lança de guerreiro para Mamadu e disse:
-
Tome-a, é sua. Entre todos, você é o mais digno dela. Antes de ser um
caçador, um homem deve ser homem. Só há uma maneira para saber se ele o é
realmente: quando coloca acima de qualquer coisa
o respeito e o amor pelos seus pais.
Com certeza o Mamadu da história não foi um covarde. Talvez tivesse
precisado lutar, e muito, contra a sua própria ambição de querer ser o
primeiro de todos, por causa de algum gesto
arriscado e destemido. No entanto a voz da responsabilidade e do amor
com os próprios pais havia falado mais forte. Antes de obedecer ao seu
orgulho, deu ouvido ao seu coração. Também para isso precisa muita
coragem.
O evangelho de Marcos, deste domingo, não esconde a dificuldade dos
apóstolos em compreender as palavras de Jesus, quando falava da sua
paixão e morte. O desfecho de sua vida, não ia
ser um triunfo com a derrota de seus inimigos e a tomada do poder.
Jesus, revelação de um Deus-Amor, Pai de todos, não podia ter “inimigos”
para vencer e humilhar. Ao contrário, estava pronto a doar a sua vida
para libertar a humanidade inteira ainda iludida
pelo antigo Adversário. Somente fazendo-se o último de todos,
obediente e humilde até a morte de cruz (cf. Fl 2,8), podia nos libertar
dos falsos ídolos do poder, da força e da dominação.
No
entanto os apóstolos continuavam imaginando um reino deste mundo, onde
os mais importantes ocupam os primeiros lugares. Para Jesus, porém,
primeiro mesmo será aquele que se faz último porque
está disposto a servir a todos. E ele deu o exemplo.
Estamos falando de teorias ou de vida cotidiana? Estamos neste mundo
ou viajando em outras galáxias? É difícil para todos pensar e projetar a
nossa própria vida como um serviço aos
outros. Todos escondemos, dentro de nós e mais ou menos bem, um grande
desejo de poder, de aparecer, de ser reconhecidos como os melhores. Os
primeiros, enfim, com mais ninguém acima de nós. Ser os últimos? Nem
pensar! Para servir os outros? Os outros é que
terão que nos obedecer. Isto se pensa, mas, obviamente, nunca se diz.
Os discursos sempre são outros. Ninguém quer admitir a própria ambição e
a própria sede de poder.
Estamos
na reta final de mais uma campanha eleitoral. Quantos candidatos se
apresentam como servidores do povo, declarando-se dispostos a tudo para
o bem de todos. Estamos livres de confiar,
mas temos direito de duvidar, sobretudo quando são feitas campanhas
milionárias. Se ganharem o cargo pleiteado, com certeza o salário dos
quatro anos não cobrirá nem de longe os gastos feitos. Devemos acreditar
que estão gastando do seu bolso para poder depois,
se forem eleitos, servir ao povo com honestidade e desprendimento?
Quando a esmola é muito grande, dizem, até o Santo desconfia. Com a
dinheirama gasta nas campanhas talvez se pudessem consertar, já, algumas
coisas que não funcionam tão bem.
Voltando
à historinha, o povo precisa do “mel” de cada dia; quer que funcionem
as escolas, os hospitais, a energia, a água, os transportes, a
habitação, a segurança pública. Esta é a verdadeira
luta urgente e a verdadeira vitória que faz sorrir de alegria os
pequenos e os pobres.
Se
os outros acharem pouco tudo isso, podem rir do “mel” e continuar a
caçar onças e cobras. O Chefe, porém, deu a lança de guerreiro a Mamadu.
E o povo a quem a daria?