sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Juramento de posse do primeiro-ministro da Espanha é feito novamente perante o crucifixo


Mariano Rajoy jura fidelidade ao cargo diante da bíblia e da constituição espanhola
Por Nieves San Martín
MADRI, quinta-feira, 22 de dezembro de 2011 (ZENIT.org) - Se os símbolos falam, o juramento de posse do novo presidente do Conselho de Ministros da Espanha, Mariano Rajoy, é uma declaração de intenções: o crucifixo volta a presidir a vida pública espanhola.
Mariano Rajoy fez o seu juramento de posse nesta quarta-feira (21) no palácio da Zarzuela, residência dos reis da Espanha, com a mão direita sobre a bíblia e um exemplar da Constituição de 1978. Na mesa, bem visível diante das câmeras, uma testemunha muda, mas eloquente: um crucifixo.
“Juro fielmente cumprir as minhas obrigações como presidente do governo com lealdade ao rei e à Constituição”. Com a mão sobre a bíblia e perante o crucifixo, Rajoy pronunciou estas palavras na presença do rei Juan Carlos I, às 11h, numa breve cerimônia, segundo fontes da Casa Real. Ele passa a ser o sexto presidente da democracia do século XX na Espanha, depois do debate parlamentar de investidura desta terça-feira, em que apresentou o seu programa de governo para obter a confiança do Congresso dos Deputados. Contando com maioria absoluta, 185 votos, o candidato garantiu a confiança do seu próprio partido e o apoio de outros dois.
O juramento foi acompanhado ainda pela rainha Sofia, pelo ex-presidente do governo, José Luis Zapatero, e pelos representantes principais das instituições espanholas.
O rei Juan Carlos I e o presidente do Congresso assinaram nesta terça-feira o real decreto de nomeação do novo chefe do Executivo espanhol, já publicado ontem (quarta-feira) no Boletim Oficial do Estado (BOE), equivalente ao Diário Oficial.
O nomeado para chefiar o governo da Espanha escolhe entre as modalidades juramento ou promessa. Rajoy escolheu fazer seu juramento de posse diante de um crucifixo, de um exemplar da Constituição aberto no título IV, sobre o Governo e a Administração, e de uma bíblia de 1791, dedicada ao rei Carlos IV, aberta no livro dos Números, capítulo XXX, sobre voto e juramento.
A mesma modalidade foi utilizada pelos ex-presidentes do governo espanhol Adolfo Suárez, Leopoldo Calvo-Sotelo e José María Aznar. Felipe González e José Luis Rodríguez Zapatero optaram pela promessa.


terça-feira, 20 de dezembro de 2011

A segunda grande onda evangelizadora



Acompanhe a segunda pregação de advento feita pelo frei Raniero Cantalamessa, OFMCap, pregador oficial da Casa Pontifícia.
NÃO HÁ MAIS GREGO OU JUDEU, BÁRBARO NEM CITA
A segunda grande onda evangelizadora após as invasões bárbaras
CIDADE DO VATICANO, terça-feira 13 dezembro, 2011 (ZENIT.org) - Oferecemos a seguir o texto da segunda Pregação do Advento 2011, realizada na sexta-feira de manhã, 9 de Dezembro, no Vaticano pelo Padre Raniero Cantalamessa, OFM Cap, pregador da Casa Pontifícia.

Nesta meditação, gostaria de falar da segunda grande onda de evangelização na história da Igreja, aquela que veio depois da queda do império romano e da mistura de povos que aconteceu com as invasões bárbaras. Nosso objetivo prático é ver o que podemos aprender para hoje. Diante da amplitude desse período histórico e da brevidade imposta por esta meditação, poderemos dar apenas algumas breves pinceladas.
1. Uma decisão de época
No fim oficial do império romano, em 476, a Europa já apresenta há tempos um rosto novo. No lugar do império único, temos reinos românico-bárbaros. Grosso modo, partindo do norte, a situação é esta: onde existiu a província romana da Bretanha, temos os anglos e os saxões; nas antigas províncias da Gália, os francos; a leste do Reno, os frísios e os alemães; na península ibérica, os visigodos; na Itália, os ostrogodos e depois os longobardos; no norte da África, os vândalos. E no Oriente ainda resiste o império bizantino.
A Igreja se vê diante de uma decisão de época: que postura adotar perante essa nova situação? Não foi rápido nem sem dilacerações que a Igreja chegou à determinação que a voltou para o futuro. Estava se repetindo, em certa medida, o que tinha acontecido no momento da separação do judaísmo para acolher os gentios na Igreja. A dissipação geral dos cristãos chegou ao clímax no saque de Roma, em 410, comandado pelo rei dos godos, Alarico. Pensava-se que tinha chegado a hora do fim do mundo, quando o mundo era identificado com o mundo romano, e o mundo romano com o cristianismo. São Jerônimo é a voz mais representativa dessa dissipação geral: “Quem teria acreditado que esta Roma, construída sobre vitórias que retumbaram pelo universo inteiro, haveria um dia de desabar?” (S. Jerônimo, Comentário a Ezequiel, III, 25, pref.).
Quem mais contribuiu, do ponto de vista intelectual, para rebocar a fé para o novo mundo foi Agostinho, com De civitate Dei. Na visão dele, que emoldura o começo de uma filosofia da história, é diferenciada a cidade de Deus da cidade terrena, identificada em alguns trechos, forçando um pouco o seu próprio pensamento, com a cidade do demônio. Por cidade terrena ele entende toda realização política, inclusive a de Roma. Portanto, não é nenhum fim do mundo, mas apenas o fim de um mundo.
Um papel determinante na abertura da fé para a nova realidade e na coordenação das iniciativas voltadas a ela foi desempenhado pelo pontífice romano, São Leão Magno. Ele tem uma consciência clara de que a Roma cristã sobreviverá à Roma pagã. Mais ainda: ela “presidirá o mundo, com a sua religião divina, mais amplamente do que teria presidido com a sua dominação terrena” (S. Leão Magno,Sermão 82).
Pouco a pouco, a postura dos cristãos quanto aos povos bárbaros muda. De seres inferiores, incapazes de civilidade, eles começam a ser considerados como possíveis futuros irmãos de fé. De ameaça permanente, o mundo bárbaro começa a ser visto pelos cristãos como um novo, vasto campo de missão. Paulo tinha proclamado abolidas, com Cristo, as distinções de raça, de religião, de cultura e de classe social, com as palavras “Não há mais grego nem judeu, circuncisão ou incircuncisão, bárbaro, cita, escravo, livre, mas apenas Cristo, em tudo e em todos” (Col 3,11). Mas que dificuldade para traduzir esta revolução na realidade da história! E não só naquele tempo.
2. A reevangelização da Europa
No tocante aos povos bárbaros, a Igreja viu-se em meio a duas batalhas. A primeira foi contra a heresia ariana. Muitas tribos bárbaras, em especial os godos, antes de penetrarem no coração do império como conquistadores tinham tido contatos no Oriente com o cristianismo, e o haviam acolhido na versão ariana, então no auge, por causa da obra do bispo Ulfila (311-383), que traduzira a bíblia para o gótico e vivera em meio àqueles povos. Quando se estabeleceram nos territórios ocidentais, eles trouxeram consigo essa versão herética do cristianismo.
O arianismo não tinha, no entanto, uma organização unitária, nem uma cultura e uma teologia comparável com a católica. No século VI, um depois do outro, os reinos bárbaros abandonaram o arianismo para aderir à fé católica, graças ao trabalho de grandes bispos e escritores católicos, e, algumas vezes, de cálculos políticos. Um momento decisivo foi o concílio de Toledo, em 589, com Leandro de Sevilha, que marcou o fim do arianismo visigótico na Espanha e, na prática, no ocidente inteiro.
Mas a batalha contra o arianismo não era coisa nova. Tinha começado no distante ano de 325. A verdadeira nova empreitada realizada pela Igreja depois do ocaso do império romano foi a evangelização dos pagãos. Ela aconteceu em dois sentidos: ad intra e ad extra, por dizer assim, ou seja, tanto junto aos povos do antigo império quanto junto aos povos que tinham recém-entrado em cena. Nos territórios do império velho, Itália e províncias, a Igreja estava implantada até aquele momento quase só nas cidades. Ela precisava estender a sua presença para o interior, para os vilarejos. O termo “pagão” deriva, como se sabe, de “pagus”, vilarejo, e assumiu o significado que tem hoje do fato de que a evangelização do interior ocorreu em geral bem depois da evangelização urbana.
Seria interessante, certamente, seguirmos este filão da evangelização que levou ao nascimento e ao desenvolvimento do sistema das paróquias, como subdivisões da diocese, mas, dentro da meta que eu me dei para agora, preciso me limitar à outra direção que também foi seguida pela evangelização: a direção ad extra, destinada a levar o Evangelho para os povos bárbaros que tinham se firmado na Europa insular e central, isto é, nas atuais Inglaterra, Holanda, França e Alemanha.
Um momento decisivo nesta empreitada foi a conversão do rei merovíngio Clodoveu, que, na noite de Natal de 498, ou 499, se deixou batizar pelo bispo de Reims, São Remígio. Ele decidiu, com isso, de acordo com os costumes daquele tempo, não apenas o futuro religioso do povo franco, mas também o dos outros povos de cá e de lá do Reno, conquistados por ele. É célebre a frase do bispo Remígio no momento de batizar Clodoveu: “Mitis depone colla, Sigamber; adora quod incendisti, incende quod adorasti”. “Inclina humildemente a nuca, Sigambro altivo; adora o que tu queimavas, queima o que tu adoravas” (Gregório de Tours, Historia Francorum,  II, 31). A este acontecimento é que a França deve o título de “filha primogênita da Igreja”.
A cristianização do continente foi levada em frente no século IX com a obra dos santos Cirilo e Metódio, que converteram os povos eslavos assentados na Europa oriental, nos territórios deixados para trás durante as ondas migratórias anteriores, que se deslocavam para o ocidente.
A evangelização dos bárbaros apresentava uma nova situação se comparada à do mundo greco-romano. Antes, o cristianismo tinha por diante um mundo culto, organizado, com regras, leis, línguas comuns; havia, enfim, uma cultura com a qual dialogar e com a qual confrontar-se. Agora, ele tem que cumprir ao mesmo tempo uma obra de civilização e de evangelização; tem que ensinar a ler e escrever, enquanto ensina a doutrina cristã. A inculturação se apresenta de um jeito inteiramente novo.
3. A epopeia monástica
A obra gigantesca que eu pincelei aqui foi realizada com a participação de todos os componentes da Igreja. Em primeiro lugar, o papa, a cuja iniciativa direta remonta a evangelização dos anglos, e que teve uma participação ativa na evangelização da Alemanha por obra de São Bonifácio e dos povos eslavos pelo trabalho de São Cirilo e São Metódio. Depois, os bispos, os párocos, que aos poucos foram formando comunidades locais estáveis. Um papel silencioso, mas decisivo, foi desempenhado por algumas mulheres. Por trás de algumas grandes conversões de reis bárbaros esteve o ascendente exercido pelas respectivas esposas: Santa Clotilde para Clodoveu, Santa Teodolinda para o rei longobardo Autari, a esposa católica do rei Edvino, que levou o cristianismo para o norte da Inglaterra.
Mas os verdadeiros protagonistas da reevangelização da Europa depois das invasões bárbaras foram os monges. No Ocidente, o monacato começado no século IV se difundiu rapidamente em duas épocas e em dois sentidos diferentes. A primeira onda partiu da Gália meridional e central, especialmente das ilhas Lérins (410) e da região de Auxerre (418), e, graças a São Patrício, formado naqueles dois centros, chegou até a Irlanda, onde fecundou a vida religiosa inteira da ilha. De lá, passou para a Escócia e para a Inglaterra num primeiro momento e, depois, voltou rumo ao continente.
A segunda onda, destinada a unificar as diversas formas de vida monástica ocidental, surge na Itália de São Bento (+547). Do século V ao VIII, a Europa se recobre literalmente de mosteiros, muitos deles de importância essencial na formação do continente, não apenas na fé, mas também na arte, na cultura e na agricultura. Não foi à toa que São Bento foi proclamado Padroeiro da Europa, e que o papa escolheu Subiaco, em 2005, para o seu discurso magistral sobre as raízes cristãs da Europa.
As grandes figuras dos monges evangelizadores pertencem quase todas à primeira das duas correntes que recordamos aqui, aquela que retorna ao continente via Irlanda e Inglaterra. Os nomes mais representativos são os de São Columbano e São Bonifácio. O primeiro, partindo de Luxeuil, evangelizou numerosas regiões do norte da Gália e as tribos germânicas meridionais, chegando até Bobbio, na Itália. O segundo, considerado o evangelizador da Alemanha, estendeu a partir de Fulda uma ação missionária que atingiu a Frísia, atual Holanda. O Santo Padre Bento XVI dedicou a ele uma das suas catequeses de quarta-feira, a de 11 de março de 2009, enfatizando a colaboração estreita com o Romano Pontífice e a ação civilizadora no seio dos povos que Bonifácio evangelizou.
Ao lermos suas vidas, temos a impressão de reviver a aventura missionária do apóstolo Paulo. A mesma ânsia de levar o evangelho a toda criatura, a mesma coragem de enfrentar toda sorte de perigos e reveses, e, para São Bonifácio e tantos outros, a mesma sorte final do martírio.
As lacunas dessa evangelização vasta são conhecidas. O próprio confronto com São Paulo põe as principais delas em destaque. O apóstolo, junto com a evangelização, procurava em todo lugar fundar uma igreja que assegurasse a sua continuidade e desenvolvimento. Era frequente, por carência de meios e pela dificuldade de locomoção dentro de uma sociedade ainda rudimentar, que aqueles pioneiros não conseguissem garantir um seguimento da própria obra.
Do programa indicado por São Remígio a Clodoveu, os povos bárbaros tendiam a pôr em prática só uma parte. Adoravam o que tinham queimado, mas não queimavam o que tinham adorado. Grande parte da bagagem idólatra e pagã permanecia presente e se mostrava na primeira oportunidade. Ocorria o que acontece com algumas estradas abertas na floresta: sem manutenção e com pouco tráfego, a selva as invade em pouco tempo. A obra mais duradoura desses grandes evangelizadores foi justamente a fundação de uma rede de mosteiros, e, com Agostinho na Inglaterra e São Bonifácio na Alemanha, a criação de dioceses e a celebração de sínodos que garantiam a continuação de uma evangelização mais estável e profunda.
4. Missão e contemplação
Agora vamos procurar encontrar alguma indicação para hoje nesse quadro histórico que traçamos. Notemos primeiro uma certa analogia entre a época que revisitamos e a situação atual. O movimento, naquele tempo, ia de Leste para Oeste, e agora é de Sul para Norte. A Igreja, com o seu magistério, também neste caso fez uma escolha de campo, que é de abertura para o que é novo e de acolhimento dos novos povos.
A diferença é que hoje não estão chegando à Europa povo pagãos ou hereges cristãos, mas povos que possuem uma religião bem constituída e consciente de si mesma. O fato novo é o diálogo que não se opõe à evangelização, mas determina o seu estilo. O beato João Paulo II, na encíclica Redemptoris Missio, sobre a validade perene do mandado missionário, se expressou com clareza a este respeito: “O diálogo inter-religioso faz parte da missão evangelizadora da Igreja. Entendido como método e meio para um conhecimento e enriquecimento recíproco, ele não está em contraposição com a missão ad gentes; antes, tem com ela vínculos especiais e é dela uma expressão. À luz da economia da salvação, a Igreja não vê contraste entre o anúncio de Cristo e o diálogo inter-religioso. Ela sente, porém, a necessidade de compô-los no âmbito da sua missão ad gentes. É necessário que estes dois elementos mantenham seu vínculo íntimo, e, ao mesmo tempo, a sua distinção, pela qual não se confundem, não se instrumentalizam e não são julgados como equivalentes, como se fossem intercambiáveis” (João Paulo II, Redemptoris Missio, 55).
O que aconteceu na Europa depois das invasões bárbaras nos mostra, acima de tudo, a importância da vida contemplativa para a evangelização. O decreto conciliar Ad gentes, sobre a atividade missionária da Igreja, escreve: “Merecem especial consideração as várias iniciativas destinadas a estabelecer a vida contemplativa. Alguns institutos, mantendo os elementos essenciais da instituição monástica, tendem a implantar a riquíssima tradição da própria ordem; outros procuram voltar à simplicidade das formas do monacato primitivo. Todos, porém, devem buscar uma real adaptação às condições locais. A vida contemplativa implica a presença eclesial na sua forma mais plena: por isso é preciso que ela seja constituída em toda parte nas jovens Igrejas” (L.G., 18).
Este convite a procurar novas formas de vida monástica para fins de evangelização, mesmo inspirando-se no monacato antigo, não ficou sem ser ouvido.
Uma das formas de realização desse auspício são as Fraternidades Monásticas de Jerusalém, conhecidas como “os monges e freiras de cidade”. Seu fundador, padre Pierre-Marie Delfieux, depois de dois anos no deserto do Saara em companhia somente da Eucaristia e da bíblia, entendeu que o verdadeiro deserto são hoje as grandes cidades secularizadas. Iniciadas em Paris na festa de Todos os Santos de 1975, essas fraternidades já estão presentes em várias grandes cidades da Europa, inclusive Roma, onde assumiram a igreja de Trinità dei Monti. O carisma deles é evangelizar através da beleza da arte e da liturgia. Seu hábito é monástico, seu estilo de vida é simples e austero, há o vínculo entre trabalho e oração; mas é nova a sua colocação no centro das cidades, geralmente em igrejas antigas de grande reclame artístico, a colaboração entre monges e freiras no âmbito litúrgico, sem deixar de haver uma total independência recíproca em habitação e autoridade. Não foram poucas as conversões de pessoas distantes, nem as voltas de cristãos “de nome” para a fé praticada, graças a esses locais.
De outro gênero, mas também participando nessa nova florada de formas monásticas, é o mosteiro de Bose, na Itália. No ecumenismo, o mosteiro de Taizé, na França, é um exemplo de vida contemplativa diretamente comprometida com a evangelização.
Em 1º de novembro de 1982, em Ávila, acolhendo uma vasta representação da vida contemplativa feminina, João Paulo II prospectou até mesmo para a vida de clausula das freiras a possibilidade de um envolvimento mais direto na obra da evangelização.
“Seus conventos”, disse ele, “são comunidades de oração em meio às comunidades cristãs, às quais vocês dão ajuda, alimento e esperança. São lugares consagrados e poderão ser ainda centros de acolhimento cristão para aquelas pessoas, particularmente os jovens, que tantas vezes estão em busca de uma vida simples e transparente, em contraste com a vida que é oferecida a eles pela sociedade do consumo”.
O apelo não passou em branco e está se traduzindo em iniciativas originais de vida contemplativa feminina aberta à evangelização. Uma delas se tornou conhecida no recente congresso promovido aqui no Vaticano pelo Pontifício Conselho para a Nova Evangelização. Essas formas novas não substituem as realidades monásticas tradicionais, muitas das quais também são centros de irradiação espiritual e de evangelização, mas se juntam a elas e as enriquecem.
Não basta que na Igreja exista quem se dedica à contemplação e quem à missão. Precisamos que a síntese entre as duas coisas aconteça na vida de cada missionário. Não basta, em outras palavras, a oração “pelos” missionários: precisamos da oração “dos” missionários. Os grandes monges que reevangelizaram a Europa depois das invasões bárbaras eram homens saídos do silêncio da contemplação e que voltavam a ela tão logo as circunstâncias permitiam. Mais ainda: no coração, eles nunca saíam do mosteiro. Colocavam em prática, por antecipação, o conselho que Francisco de Assis daria aos seus frades quando os enviasse às estradas do mundo: “Nós temos uma ermida sempre conosco, onde quer que estejamos, e, toda vez que quisermos, podemos voltar para dentro dela, como eremitas. O irmão corpo é a ermida e a alma é o eremita que a habita para falar com Deus e meditar” (Legenda Perugina, 80 - FF, 1636).
Temos disso um exemplo de muito mais autoridade. A jornada de Jesus era um entrecruzar-se admirável de oração e pregação. Ele não rezava apenas antes de pregar, mas rezava para saber o que pregar, para buscar na oração o que anunciar ao mundo. “O que digo, é como o Pai o disse a mim” (Jo 12,50). Era dali que surgia em Jesus a “autoridade” que tanto impressionava em seu falar.
O esforço por uma nova evangelização está exposto a dois perigos. Um deles é a inércia, a preguiça, o não fazer nada e deixar que os outros façam tudo. E o outro é se lançar num ativismo humano febril e vazio, com o resultado de perder pouco a pouco o contato com a fonte da palavra e da sua eficácia. Mas como ficar tranquilos pregando enquanto tantas exigências reclamam a nossa presença? Como não correr enquanto a casa está pegando fogo? Imaginemos o que aconteceria com um corpo de bombeiros que corresse para apagar um incêndio e, quando chegasse ao local, percebesse que não trouxe nos reservatórios nenhuma gota d’água. Somos nós, quando corremos para pregar sem rezar.
A oração é essencial para a evangelização porque “a pregação cristã não é primariamente comunicação de doutrina, mas de existência”. Faz mais evangelização quem reza sem falar do que quem fala sem rezar.
5. Maria, estrela da evangelização
Terminemos com um pensamento sugerido pelo tempo litúrgico que estamos vivendo e pela solenidade da Imaculada Conceição. Uma vez, num diálogo ecumênico, um irmão protestante me perguntou, sem polêmicas, apenas para entender: “Por que vocês, católicos, dizem que Maria é a estrela da evangelização? O que ela fez para justificar esse título?”. Para mim, foi a ocasião de refletir, e eu não demorei a encontrar a razão profunda. Maria é a estrela da evangelização porque ela trouxe a Palavra não para este ou para aquele povo, mas para o mundo inteiro!
E não só por isso. Ela carregou a Palavra no ventre, não na boca. Estava cheia, fisicamente inclusive, de Cristo, e o irradiava com sua simples presença. Jesus lhe saía dos olhos, do rosto, de toda a pessoa. Quando nos perfumamos, não precisamos avisar. Basta estar perto. Maria, especialmente no tempo em que trazia Jesus no ventre, estava cheia do perfume de Cristo.
Podemos dizer que Maria foi a primeira consagrada de clausura da Igreja. Depois do Pentecostes, ela como que entrou em clausura. Através das cartas dos apóstolos, conhecemos inúmeras personagens, entre elas tantas mulheres, da primitiva comunidade cristã. E achamos menção a uma certa Maria (cf. Rom 16,6), mas não é ela. De Maria, a Mãe de Jesus, nada. Ela desaparece no mais profundo silêncio. Mas o que significou para João tê-la ao lado enquanto escrevia o Evangelho e o que pode significar para nós tê-la ao lado enquanto proclamamos o mesmo Evangelho! “Primícias dos Evangelhos”, escreve Orígenes, “é o de João, cujo sentido profundo não se pode perceber sem se ter apoiado a cabeça no peito de Jesus nem se ter recebido dele Maria como própria mãe” (Orígenes, Comentário a João, I, 6,23).
Maria inaugurou na Igreja uma segunda alma, ou vocação, que é a alma escondida e orante, junto com a alma apostólica ou ativa. É o que exprime com louvor o ícone tradicional da Ascensão, da qual temos no lado direito desta capela uma representação. Maria está em pé, com os braços abertos em espera orante. Em torno dela, os apóstolos, todos com um pé ou mão elevada, em movimento, representando a Igreja ativa, que está em missão, que fala e age. Maria está imóvel abaixo de Jesus, no ponto exato de onde ele ascendeu, quase como mantendo viva a memória dele e a espera pelo seu retorno.
Encerremos ouvindo as palavras finais da Evangelii Nuntiandi, de Paulo VI, que pela primeira vez nos documentos pontifícios chama Maria de estrela da evangelização: “Na manhã de Pentecostes, Ela presidiu com a oração o início da evangelização sob a ação do Espírito Santo. Seja ela a estrela da evangelização sempre renovada que a Igreja, dócil ao mandado do Senhor, deve promover e cumprir, particularmente nestes tempos difíceis, mas cheios de esperança!”.

Estudo sobre São José: história e a importância do santo carpinteiro (Parte I)



Salvatore Vitiello explica a história e a importância do santo carpinteiro
Por Antonio Gaspari
ROMA, segunda-feira, 19 dezembro, 2011 (ZENIT.org) - Tem centenas de milhões de devotos no mundo. Há milhões de meninos e meninas que têm o seu nome. Está bem presente no Evangelho, no Presépio e nas Igrejas, mas a sua história humana e a sua importância na história da salvação são pouco conhecidas.
Estamos falando de São José, esposo de Maria e pai adotivo de Jesus. Para saber mais ZENIT entrevistou o Reverendo Professor Salvatore Vitiello Coordenador do Mestrado em Arquitetura, arte sacra e Liturgia da Universidade Europeia de Roma e do Pontifício Ateneu Regina Apostolorum
Quem foi São José?
Vitiello: Era antes de mais nada um homem autêntico, que soube viver, com inteligência, fé e total dedicação, as circunstâncias nas quais Deus o tinha colocado, reconhecendo nelas a presença do mesmo mistério. Era um judeu observante, portanto, com profunda espera  do cumprimento das promessas de Deus para o Seu povo. Nos falam dele sobretudo os santos Evangelistas Lucas e Mateus, quando nos contam o início da nossa Salvação, do Anúncio do anjo à Maria de Nazaré, “uma virgem prometida em casamento a um homem da casa de Davi, chamado José”, que se teria tornado Mãe do Altíssimo. A casa de Davi (cf. Lc 1,27) era a descendência genealógica, a partir da qual, segundo as profecias do Antigo Testamento, Deus teria suscitado o Rei, que teria libertado o povo de Israel. A história de São José, a sua santidade, a atualidade da sua intercessão e do seu modelo para nós hoje, e do seu patrocínio com relação à Igreja universal iniciam, por providêncial Vontade divina, desde a ligação “esponsal” com Maria. Acolhendo a Maria, o Desenho de Deus sobre Ela atraía e envolvia também toda a sua vida. Na verdade, ele foi ainda convidado a "cooperar", num modo único e extraordinário, na mesma Obra da Salvação, tomando consigo Maria como sua esposa e se tornando, portanto, o pai "legal" de Jesus. De fato, no início da manifestação pública do Senhor Jesus, a primeira reação de cética maravilha dos habitantes de Nazaré foi a de perguntar: "Não é ele o filho do carpinteiro?" (cf. Mt 13,55).
O que o convenceu a aceitar Maria já grávida?
Vitiello: O entender, por revelação divina, que esta aceitação coincidiria com a adesão à vontade de Deus para ele: acolher aquela jovem israelita, que Ele amava profundamente, com a sua Criança, significava, para José, acolher a entrada de Deus na história e na sua mesma vida. Havia começado, com a concepção de Jesus no seio imaculado da Virgem e com a especial Vocação de José, o novo “método” de Deus: o Altíssimo, Criador do universo e Senhor de Israel, Aquele do qual não se podia pronunciar o Nome, nem fazer imagem, o absolutamente Outro, se revelava, numa hora por meio de um ponto preciso, um rosto, aquele da Criança que Maria tinha concebido, aquele da Criança que tinha os mesmos traços de Maria. Tudo o que tinha a ver com essa mulher e com o seu filho, teria a ver com o próprio Deus. São José o tinha entendido: depois da inicial dificuldade de tomar posição diante daquele acontecimento – dificuldade na qual ele mostrou toda a própria “justiça” (cf. Mt 1,19), tomando a decisão de não repudiar Maria, mas somente de deixá-la no segredo, para não expô-la ao apedrejamento previsto nas leis judaicas – ele recebeu o anúncio do anjo que o chamava a assumir para si a sua esposa e a tornar-se pai Daquele que tinha sido gerado por obra do Espírito Santo. Daquele momento, ele se dedicou sem reserva alguma ao serviço humilde, silencioso e cheio de amor, da sua nova família, a Família de Deus. 
Como ele desempenhou o papel de pai de Jesus, ainda sabendo que ele era o Filho de Deus?
Vitiello: O relacionamento pessoal entre Cristo e São José, tal como se desenvolveu diariamente e especialmente nos anos da "vida oculta" do Senhor em Nazaré, é para nós um mistério muito delicado e extraordinário. Sabemos, como a mesma Igreja que nos transmite nas Escrituras, que "Aquele de quem toma o nome toda paternidade no céu e na terra" (Ef 3.15) chamou José para se tornar, na terra, o pai de Jesus, o Filho eterno feito homem . Sabemos que ele aceitou, sem reservas e em obediência total, esta missão sublime, que, nas palavras do Papa Pio XI, foi colocada "recolhida, silenciosa, despercebida e desconhecida [...] na humildade e no serviço" entre as duas missões de João Batista e de São Pedro (cf. Pio XI, Homilia na Solenidade de São José, 19 de março de 1928). Conhecemos, depois, os acontecimentos que se sucederam até o retorno a Nazaré do Egito, onde tinha levado a Sagrada Família para escapar da ira assassina do rei Herodes, até o reencontro de Jesus adolescente entre os doutores do Templo. Sobre a paternidade de São José e a filiação de Jesus, no entanto, existe como um mistério - o mistério da íntima relação entre Cristo e José - , do qual podemos ter um vislumbre de algo, por ocasião do encontro de Jesus no Templo. São Lucas escreve que, tendo-o encontrado, a Mãe disse-lhe: "Filho, por que você fez isso conosco? Eis que teu pai e eu ansiosos te procurávamos "(Lc 2,48). As palavras de Maria revelam a "angústia" de São José, o amor profundo que ele tinha por Jesus e também como se ele não estava sozinho para cumprir a missão recebida, mas a compartilhava - poderíamos dizer - cada “detalhe", com a mesma Beata Virgem Maria, tendo diante de seus olhos o constante e feliz "sim" dela à Vontade de Deus, aprendendo dela a reconhecer no filho, com profunda admiração, o Mistério Presente. Na mesma passagem do Evangelho se diz que Jesus "desceu com eles a Nazaré e foi obediente " (Lc 2,51). O Filho de Deus, nascido da Virgem, tinha-se despojado da glória divina para assumir a nossa condição humana, para abaixar-se até "mendigar" o nosso amor e a nossa acolhida, que eram o amor e acolhida de Maria e José de Nazaré. O mesmo Amor mendigava o ser amado e se confiava totalmente aos cuidados de São José, de tal forma que acreditamos que tenha sido, ainda na consciência orante da própria responsabilidade, extraordinariamente agradável poder tomar conta do Deus menino, tanto que na tradicional oração a São José recitamos: “O felicem virum, beatum Ioseph – oh, homem feliz, beato José, ao qual foi concedido não somente de ver Aquele que muitos reis desejaram ver e não viram, ouvir e não ouviram, mas também de abraça-lo, beijá-lo, vestí-lo e cuidá-lo!”
(Tradução TS)
Fonte: Zenit
19/12/11

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Estamos em obras: Nossa Casa, Nossa bênção!


Estamos em obras, sim! uma correria só. Abençoados pela providência de nosso Deus. Assim deve ficar nossa casa quando do término da construção. Claro que neste momento temos pouco tempo e estamos cientes que nem tudo deve ficar pronto até Fevereiro de 2012, mas a alegria de ver um sonho tornar-se realidade traz ao nosso coração muita felicidade. As dificuldades tem sido muitas, mas a graça de Deus e as suas surpresas tem sido bem maiores. 
Costumamos dizer que ela é "Nossa Casa, Nossa bênção!" como o slogan da construção da Sede Nacional do Movimento Eclesial que participamos, a RCC Brasil. Em 2010, durante o lançamento da pedra fundamental em Canas-SP, estivemos na missa no local e colhemos pedras e areia do terreno simbolizando que também nós tomávamos posse desta bênção que o Senhor reservou a RCC e a seus membros. No início das fundações de nossa construção fiz questão de por uma pedra de Canas ressaltando este desejo de que em nossa lar também possa se irradiar a Cultura de Pentecostes para o mundo. Ontem, 13, lançamos a terra colhida em Canas sob o solo que neste momento esta sendo preparando em nossa casa.
A corrida contra o tempo continua, São José Operário é nosso patrono nesta hora para que nosso lar seja uma "Casa de Oração", pois lá viverão dois jovens, Sentinelas da Manhã, fieis a Deus, Católicos fervorosos e militantes, devotos de Maria.
Agora é hora de confiar e trabalhar para este sonho realizar-se. Mãos à obra!

Vaticano confirma data da visita do Papa Bento XVI ao Rio


Jovens de todo o mundo são esperados para a Jornada Mundial da Juventude, tradicional encontro com o Papa que terá como palco a cidade do Rio de Janeiro

O Vaticano confirmou hoje, 13, a data da visita do Papa Bento XVI ao Rio de Janeiro: Será entre os dias 23 e 28 de julho de 2013, por ocasião da realização da Jornada Mundial da Juventude (JMJ) Rio2013, que reunirá jovens de todo o mundo na cidade maravilhosa. A data oficial foi decidida durante a reunião entre o Pontifício Conselho para os Leigos (PCL), que é o Comitê Organizador Central da Jornada, e a comissão do Comitê Organizador Local (COL) do Rio, que está em Roma desde ontem.

Estão participando pelo COL o presidente da comissão e arcebispo do Rio, Dom Orani João Tempesta, os dois bispos auxiliares que acompanham mais diretamente a Jornada, Dom Antônio Augusto Dias Duarte e Dom Paulo Cezar Costa, monsenhor Joel Portella Amado, da coordenação geral, e os padres Márcio Queiroz, responsável pela Comunicação, e Renato Martins, responsável pelos Atos Centrais.

Entre as questões estão sendo tratadas está também a escolha da logomarca da JMJ Rio2013. Um concurso foi realizado para a escolha do símbolo oficial e mobilizou pessoas de todo o Brasil e de outros países que enviaram seus trabalhos ao COL. Os melhores desenhos foram selecionados e levados pela Comissão ao PCL, que escolheu a logo finalista. Segundo Dom Orani João Tempesta, em breve será anunciada a data para apresentação oficial da logo.

A comissão retorna ao Rio amanhã e está prevista uma reunião de todos os setores do Comitê para que seja apresentado o que foi ratificado e o que foi retificado do documento de trabalho do COL, que contem os projetos de cada setor.

JMJ
A Jornada Mundial da Juventude é um encontro internacional de jovens para celebrar a mensagem de amor, paz e união pregada por Jesus Cristo. Idealizada pelo beato João Paulo II, o encontro dura aproximadamente uma semana. A última edição da JMJ foi realizada em agosto de 2011, na cidade de Madri, na Espanha, e reuniu cerca de dois milhões de jovens do mundo inteiro.
O Brasil já vive o clima da Jornada, com a peregrinação da Cruz dos jovens e do Ícone de Nossa Senhora no Brasil. Os símbolos da JMJ percorrerão todas as dioceses brasileiras e os países do Cone Sul em preparação para a JMJ Rio2013. Para acompanhar de perto o trajeto da cruz, a JMJ Rio2013 lançou o aplicativo “Siga a Cruz” para tablets,  Iphone e android. Também em preparação a este grandioso evento, está em andamento o Concurso para a escolha da letra do Hino da JMJ Rio2013 que, assim como a Logo, formam a identidade do evento.

Assessoria de Imprensa JMJ Rio2013

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Ide pelo mundo inteiro



Ide ao mundo inteiro

Leia a primeira pregação de advento feita pelo frei Raniero Cantalamessa, OFMCap, pregador oficial da Casa Pontifícia.


Em resposta ao apelo do Sumo Pontífice de um renovado compromisso com a evangelização e em preparação para o Sínodo dos Bispos de 2012 sobre o mesmo assunto, me proponho a identificar, nestas meditações do Advento, quatro ondadas da nova evangelização na história da Igreja, ou seja, quatro momentos nos quais se testemunham uma aceleração ou uma retomada do compromisso missionário. São eles:

1. A expansão do cristianismo nos primeiros três séculos de vida, até a véspera do edito de Constantino, cujos protagonistas, em primeiro lugar, eram os profetas itinerantes e, depois, os bispos;

2. Os séculos VI-IX, em que assistimos à reevangelização da Europa após as invasões bárbaras, especialmente pela obra dos monges;

3. O século XVI com a descoberta e a conversão ao cristianismo dos povos do "novo mundo", especialmente pela obra dos frades;

4. A época atual que vê a Igreja envolvida numa reevangelização do Ocidente secularizado, com a participação determinante dos leigos.

Em cada um desses momentos tentarei destacar o que podemos aprender na Igreja de hoje: quais erros evitar e os exemplos a imitar e quais contribuições específicas que podem dar à evangelização os pastores, os monges, os religiosos de vida ativa e os leigos.

1. A difusão do cristianismo nos primeiros três séculos.


Hoje começamos com uma reflexão sobre a evangelização cristã nos primeiros três séculos. Principalmente um motivo faz deste período um modelo para todos os tempos. É o período no qual o cristianismo encontra o seu caminho exclusivamente por própria força. Não há nenhum "braço secular" que o apoie; as conversões não são determinadas pelas vantagens externas, materiais ou culturais. Ser cristão não é um costume ou uma moda, mas uma escolha contra a corrente, muitas vezes com risco de vida. Em alguns aspectos, a situação se voltou a criar hoje em diferentes partes do mundo.

A fé cristã nasce com uma abertura universal. Jesus tinha dito aos seus apóstolos para irem "ao mundo inteiro" (Mc 16, 15), para "fazerem discípulos a todas as nações" (Mt 28, 19), para serem testemunhas “até os confins da terra” (At 1, 8), para “pregarem a todos os povos a conversão e o perdão dos pecados” (Lc 24, 47).

A aplicação do princípio desta universalidade já acontece na geração apostólica, embora não sem dificuldade e lacerações. No dia de Pentecostes a primeira barreira é superada, a da raça (os três mil convertidos pertenciam a outros povos, mas eram todos crentes do judaísmo); na casa de Cornélio e no assim chamado concílio de Jerusalém, especialmente por impulso de Paulo, a barreira mais difícil de todas foi superada, aquela religiosa que separava os hebreus dos gentios. O evangelho tem, dessa forma, o mundo inteiro diante de si, ainda que por agora esse mundo seja limitado, no conhecimento dos homens, ao Mediterrâneo e às fronteiras do Império Romano.

Mais complexo é seguir a expansão de fato, ou geográfica, do cristianismo nos três primeiros séculos que, porém, é menos necessária para o nosso propósito. O estudo mais abrangente, e até agora insuperável a esse respeito é aquele de Adolph Harnack, "Missão e expansão do cristianismo nos primeiros três séculos".

Um aumento acentuado na atividade missionária da Igreja se realiza sob o imperador Commodo (180-192) e, em seguida, na segunda metade do século III, até as vésperas da grande perseguição de Diocleciano (302). Este, além das ocasionais perseguições locais, foi um período de relativa paz que permitiu à Igreja primitiva consolidar-se internamente e desenvolver um novo tipo de atividade missionária.

Vejamos em que consiste esta novidade. Nos dois primeiros séculos a propagação da fé foi confiada à iniciativa pessoal. Tratava-se dos profetas itinerantes, mencionados na Didaqué, que moviam-se de um lugar para outro; muitas conversões deveram-se a contatos pessoais, favorecidos pelos trabalhos comuns exercitados pelas viagens e pelas relações comerciais, pelo serviço militar e por outras circunstâncias da vida. Orígenes nos dá uma descrição comovente do zelo desses primeiros missionários:

"Os cristãos fazem todo o esforço possível para espalhar a fé por toda a terra. Para esse fim, alguns deles se propõem formalmente como tarefa das suas vidas o peregrinar não somente de cidade em cidade, mas também de município em município e de vilarejo em vilarejo para ganhar novos fiéis para o Senhor. Nem se passe pela cabeça, espero, que eles façam isso por lucro, pois até mesmo, muitas vezes se recusam a aceitar o que é necessário à vida".

Agora, na segunda metade do século III, estas iniciativas pessoais são cada vez mais coordenadas e em parte substituídas pela comunidade local. O bispo, até mesmo por reação aos efeitos de desintegração da heresia gnóstica, conquista a melhor sobre os mestres, como diretor da vida interna da comunidade e centro propulsor da sua atividade missionária. A comunidade é agora o sujeito evangelizador, a tal ponto que um erudito como Harnack, certamente não suspeito de simpatia pela instituição, possa afirmar: "Devemos ter por certo que a mera existência e a atividade constante das comunidades individuais, foi o principal fator na propagação do cristianismo".

No final do terceiro século, a fé cristã penetrou praticamente todos os estratos da sociedade, já tem sua própria literatura em língua grega e uma, embora no início, em língua latina; possui uma sólida organização interna; começa a construir edifícios sempre mais amplos, sinal do aumento do número de fiéis. A grande perseguição de Diocleciano, além das muitas vítimas, não fez nada mais que destacar o fato de que a força da fé cristã já era irreprimível. A última luta de braço entre o Império e o cristianismo é testemunha disso.

No fundo, Constantino não vai fazer nada mais do que tomar nota dessa nova relação de forças. Não será ele que vai impor o cristianismo para o povo, mas o povo que vai lhe impor o cristianismo. Afirmações como aquelas de Dan Brown no romance "O Código Da Vinci" e de outros propagadores, segundo os quais  foi Constantino, por razões pessoais, a transformar, com o seu edito de tolerância e com o concílio de Nicéia, uma obscura seita religiosa judaica na religião do império, são baseadas numa total ignorância dos fatos que precederam esses eventos.

2. As razões do sucesso

Um tema que sempre apaixonou os historiadores é aquele das razões do triunfo do cristianismo. Uma mensagem, nascida em um canto obscuro e desprezado do Império, entre pessoas simples, sem cultura e sem poder, em menos de três séculos, se estende a todo o mundo então conhecido, subjugando a refinadíssima cultura dos gregos e o poder imperial de Roma!

Entre as diversas razões do sucesso, alguns insistem no amor cristão e no exercício ativo da caridade, até torná-lo "o fator mais importante e poderoso para o sucesso da fé cristã", de tal forma que induziria mais tarde o imperador Juliano o Apóstata, a fornecer o paganismo de semelhantes obras de caridade para combater este sucesso.

Harnack, por outro lado, dá uma grande importância ao que ele chama de a natureza "sincretista" da fé cristã, ou seja, da capacidade de conciliar em si as tendências opostas e os diversos valores presentes nas religiões e na cultura do tempo. O cristianismo se apresenta ao mesmo tempo, como a religião do Espírito e do poder, que é acompanhada por sinais sobrenaturais, carismas e milagres, e como a religião da razão e do Logos integral, “a verdadeira filosofia”, nos dizeres de Justino Mártir. Os autores cristãos são "os racionalistas do sobrenatural", diz Harnack citando as palavras do apóstolo Paulo sobre a fé como "tratamento racional" (Romanos 12,1).

Desta forma o cristianismo reúne em si, num perfeito equilíbrio, o que o filósofo Nietzsche define o elemento apolíneo e o elemento dionisíaco da religião grega, o Logos e o Pneuma, a ordem e o entusiasmo, a medida e o excesso. É isto que, pelo menos em parte, entendiam os Padres da Igreja com o tema da "sóbria embriaguez do Espírito".

"A religião cristã – escrevia Harnack no final da sua monumental pesquisa – , desde o início, apareceu com uma universalidade que a permitiu reivindicar para si toda a vida inteiramente, com todas as suas funções, as suas alturas e profundidades, sentimentos, pensamentos e ações. Foi esse espírito de universalidade que lhe garantiu a vitória. Foi isso que a levou a professar que o Jesus proclamado por ela era o Logos divino ... Assim se ilumina com nova luz e aparece quase uma necessidade, até mesmo aquela poderosa atração pela qual chegou a absorver e a submeter a si o helenismo. Tudo o que era de alguma forma capaz de vida entrou como elemento na sua construção ... E essa religião não deveria vencer? "

A impressão que se tem ao ler este resumo é que o sucesso do cristianismo é devido a uma combinação de fatores. Alguns foram tão longe na busca das causas deste sucesso que encontraram vinte motivos a favor da fé e muitos outros que estavam agindo na direção oposta, como se o êxito final dependesse da prevalência do primeiro sobre o segundo.

Agora eu gostaria de destacar o limite inerente a tal abordagem histórica, mesmo quando esta é feita por historiadores que tem fé como aqueles que até agora tenho tido em conta. O limite, devido ao mesmo método histórico, é de dar mais importância ao sujeito do que ao objeto da missão, mais aos evangelizadores e às condições em que ela ocorre, do que ao seu conteúdo.

A razão que me empurra a fazê-lo é que isso é também o limite e o perigo inerente a tantas abordagens atuais e mediáticas, quando se fala de uma nova evangelização. Esquece-se de uma coisa muito simples: que Jesus mesmo tinha dado, antecipadamente, uma explicação da difusão do seu Evangelho e é dessa que devemos começar toda vez que nos propomos um novo esforço missionário.

Escutemos mais uma vez duas breves parábolas evangélicas, aquela da semente que cresce também à noite e aquela da semente de mostarda.

“E dizia: ‘acontece com o Reino de Deus o mesmo que com o homem que lançou a semente na terra: ele dorme e acorda, de noite e de dia, mas a semente germina e cresce, sem que ele saiba como. A terra por si mesma produz fruto: primeiro a erva, depois a espiga e, por fim, a espiga cheia de grãos. Quando o fruto está no ponto, imediatamente se lhe lança a foice, porque a colheita chegou’”.(Mc 4, 26-30).

Esta parábola, por si só, diz-nos que a razão essencial para o sucesso da missão cristã não vem de fora, mas de dentro, não é obra do semeador e nem sequer principalmente do solo, mas da semente. A semente não pode ser jogada por si só, no entanto, é automaticamente e por si mesma que ela cresce. Depois de ter jogado a semente o semeador pode também ir dormir, a vida da semente já não depende dele. Quando esta semente é "a semente jogada na terra e morta", ou seja, Jesus Cristo, nada poderá impedir que essa "dê muitos frutos". Pode-se dar todas as explicações que você quiser desses frutos, mas estas permanecerão sempre na superfície, nunca captarão o essencial.

Quem captou com clareza a prioridade do objeto do anúncio sobre o sujeito é o apóstolo Paulo.

"Eu plantei, Apolo regou, mas é Deus quem fazia crescer”. Estas palavras parecem ser um comentário sobre a parábola de Jesus. Não se trata de três operações com a mesma importância; de fato, o apóstolo acrescenta: " Assim, pois, aquele que planta, nada é: aquele que rega nada é; mas imorta somente Deus, que dá o crescimento”. (1 Cor 3, 6 -7). A mesma distância qualitativa entre o sujeito e o objeto do anúncio está presente em outra palavra do Apóstolo: "Mas nós temos este tesouro em vasos de barro, para que este grande poder seja atribuído a Deus e não a nós" ( 2 Cor 4,7). Tudo isso se traduz nas exclamações programáticas: "Nós não pregamos a nós mesmos, mas o Senhor Jesus Cristo!" e ainda "Nós pregamos Cristo crucificado".

Jesus pronunciou uma segunda parábola com base na imagem da semente que explica o sucesso da missão cristã e que dever ser tida em conta hoje, diante da imensa tarefa de reevangelizar o mundo secularizado.

“E dizia: ‘com que compararemos o Reino de Deus? Ou com que parábola o apresentaremos? É como um grão de mostarda que, quando é semeado na terra – é a menor de todas as sementes da terra – mas, quando é semeado, cresce e torna-se maior que todas as hortaliças, e deita grandes ramos, a tal ponto que as aves do céu se abrigam à sua sombra” (Mc 4, 30-32).

O ensinamento que Cristo nos dá com esta parábola é que o seu Evangelho e a sua mesma pessoa é a menor coisa que existe sobre a terra porque não há nada menor e mais fraco do que uma vida que termina numa morte de cruz. No entanto, esta minúscula "semente de mostarda" está destinada a se tornar uma grande árvore, de modo a acomodar em seus ramos todos os pássaros que vão refugiar-se ali. Isso significa que toda a criação, absolutamente toda irá ali encontrar refúgio.

Que contraste com as reconstruções históricas mencionadas acima! Tudo lá parecia incerto, aleatório, suspenso entre o sucesso e o fracasso; aqui tudo já foi decidido e garantido desde o começo! No final do episódio da unção de Betânia, Jesus pronunciou estas palavras: "Em verdade vos digo que, onde quer que este Evangelho seja anunciado, em todo o mundo, em memória dela se dirá também o que ela fez" (Mateus 26,13 ). A mesma consciência tranquila de que um dia sua mensagem seria anunciada “a todo o mundo”. E certamente não é uma profecia "post eventum", porque naquele momento, tudo pressagiava o oposto.

Até mesmo nisso quem melhor captou "o mistério escondido" foi Paulo. Me impressiona sempre um fato. O Apóstolo pregou no Areópago de Atenas e assistiu a uma rejeição da mensagem, educadamente expressada com a promessa de ouvi-lo em outra ocasião. De Corinto, onde ele foi logo depois, escreveu a Carta aos Romanos, onde afirma ter recebido a tarefa de conduzir "à obediência da fé todas as nações" (Rm 1, 5-6). O insucesso não avariou minimamente a sua confiança na mensagem: "Eu não me envergonho - grita - do evangelho, porque é potência de Deus para a salvação de todo aquele que crê, do judeu, primeiro, como do grego" (Rom 1, 16 ). Apóstolo Paulo, dá-nos um pouco "desta tua fé e desta tua coragem e não nos desanimaremos diante da tarefa sobre-humana que está diante de nós!

"Toda árvore, diz Jesus, é reconhecida pelos seus frutos" (Lc 6, 44). Isto é verdade para toda árvore, exceto para a árvore nascida dele, o cristianismo (e de fato ele está falando aqui dos homens); essa única árvore não é conhecida pelo fruto, mas a partir da semente e da raiz. No cristianismo a plenitude não está no fim, como na dialética hegeliana do devir (“o verdadeiro é o inteiro”), mas está no princípio; nenhum fruto, nem mesmo os maiores santos, acrescentam algo à perfeição do modelo. Neste sentido tem razão quem afirmou que “o cristianismo não é perfectível”.

3. Semear e... ir dormir

Aquilo que os historiados das origens cristãs não registraram ou dão pouca importância é a certeza inabalável que os cristãos da época, pelo menos os melhores deles, tinham sobre a bondade e a vitória final da sua causa. "Vocês podem nos matar, mas não nos podem prejudicar", dizia Justino Mártir ao juiz romano que o condenava à morte. No final foi essa tranquila certeza que lhes garantiu a vitória e convenceu as autoridades políticas da inutilidade dos esforços para suprimir a fé cristã.

É isso o que mais nos acontece hoje: despertar nos cristãos, pelo menos naqueles que pretendem se dedicar ao trabalho da reevangelização, a certeza íntima da verdade do que anunciamos. "A Igreja, Paulo VI disse certa vez, precisa recuperar o desejo, o prazer e a certeza da sua verdade". Devemos acreditar primeiramente nós, em tudo o que anunciamos; mas acreditar realmente, "com todo o coração, com toda a alma, com toda a mente". Temos de ser capazes de dizer com Paulo: "Animados pelo mesmo espírito de fé, como está escrito: Eu acreditei, portanto, eu falei, nós também acreditamos e, portanto, falamos" (2 Coríntios 4, 13).

A tarefa prática que as duas parábolas de Jesus nos designam é semear. Semear com mãos cheias, “no momento adequado e inadequado" (2 Tm 4, 2). O semeador da  parábola que sai para semear não se preocupa com o fato de que algumas sementes acabem na rua e entre os espinhos, e pensar que aquele semeador, fora da metáfora, é ele mesmo, Jesus! A razão é que, neste caso, não se pode saber com antecedência qual terreno se revelará bom, ou duro como o asfalto e sufocante como um arbusto. Há no meio a liberdade humana que o homem não pode prever, e Deus não quer violar. Quantas vezes entre as pessoas que ouviram algum sermão ou leram um determinado livro, verifica-se que quem o tomou mais a sério e teve a vida mudada era a pessoa que menos se esperava, alguém que estava ali por acaso, ou até mesmo relutante. Eu mesmo poderia contar dezenas de casos.

Semear então e depois... ir dormir! Ou seja, semear e depois não estar lá o tempo todo olhando, quando brota, onde brota, quantos centímetros está crescendo diariamente. A germinação e o crescimento não é nosso negócio, mas de Deus e do ouvinte. Um grande humorista Inglês do século XIX, Jerome Klapka Jerome, disse que a melhor maneira de fazer demorar a ebulição da água numa panela é aquela de estar de olho nela e esperar com impaciência.

Fazer o contrário é fonte inevitável de ansiedade e de impaciência: coisas que Jesus não gosta e que ele nunca fez quando esteve na terra. No Evangelho, ele nunca parece ter pressa. "Não andem ansiosos pelo amanhã, dizia aos seus discípulos, porque o amanhã cuidará de si mesmo. Basta a cada dia o seu mal” (Mateus 6, 34).

Neste sentido, o poeta cristão Charles Péguy põe na boca de Deus palavras que são boas para meditarmos:

"Disseram-me que há homens que trabalham bem e dormem mal. Que não dormem. Que tem falta de confiança em mim. É quase pior do que se não trabalhassem, mas dormissem, porque a preguiça não é pecado maior do que a ansiedade ... Não falo, diz Deus, daqueles homens que não trabalham e não dormem. Esses são pecadores, é claro ... Falo daqueles que trabalham e não dormem ... Tenho pena deles. Eles não confiam em mim ... Governam muito bem seus assuntos durante o dia. Mas não querem confiar-me o governo durante a noite... Quem não dorme é infiel à Esperança... ".

As reflexões realizadas nesta meditação nos levam, em conclusão, a colocar na base do esforço para uma nova evangelização um grande ato de fé e de esperança para sacudir de cima qualquer sentimento de impotência e resignação. Temos diante de nós, é verdade, um mundo fechado no secularismo, inebriado pelos sucessos da técnica e das possibilidades oferecidas pela ciência, refratário ao anúncio do Evangelho. Mas era talvez menos confiante em si e menos refratário ao evangelho o mundo no qual viviam os primeiros cristãos, os gregos com a sua sabedoria e o Império Romano com o seu poder?

Se houver algo que possamos fazer, depois de ter "semeado", é "irrigar", com a oração, a semente lançada. Por isso terminemos com a oração que a liturgia nos faz recitar na Missa "para a evangelização dos povos":

Ó Deus, tu queres que todos os homens sejam salvos e cheguem ao pleno conhecimento da verdade; olha quão grande é a tua messe e manda operários, para que seja anunciado o Evangelho à toda criatura, e o teu povo, reunido pela palavra de vida e moldado pela força dos sacramentos, prossiga no caminho da salvação e do amor.

Por Cristo nosso Senhor. Amém.

Pe. Raniero Cantalamessa, OFMCap