Reflexão por ocasião do I Dmonigo do Advento
Por Dom Pedro José Conti - Bispo de Macapá
Ninguém
sabia se havia sido um anjo ou um demônio a colocar aquela pedra enorme
naquele lugar. Ela estava encostada na montanha, mas podia
desprender-se dela a qualquer
momento e acabar com boa parte da pequena vila que estava no fundo do
vale. Os homens tinham acolhido o desafio de vigiar os movimentos da
pedra. Todas as noites, um deles subia ao monte com uma lanterna na mão e
ficava observando. Se a pedra saísse do lugar,
ele devia avisar a população da vila tocando uma trombeta. Podia chover
ou soprar o vento, com a lua no céu ou se caísse neve, um homem vigiava
para que todos pudessem dormir em paz. Ficar vigiando a pedra era uma
grande fadiga, mas também um orgulho. Na manhã
seguinte, aquele homem descia do monte e parecia-lhe que toda a vila
estivesse sorrindo para ele, agradecida.
O
tempo, porém, passou e trouxe outras satisfações e outros orgulhos.
Assim, aos poucos, pareceu inútil aquilo que antes era considerado
importante. Havia séculos que a
grande pedra estava lá e nunca tinha se mexido, porque deveria cair logo
agora? Também, diziam, era tarefa do prefeito pagar um vigia para este
trabalho. E o governador? Que ele também ajudasse com o dinheiro
público.
Depois
de muitas discussões, os homens decidiram suspender o trabalho da
vigilância. Não tinha mais graça nenhuma continuar. Nunca é fácil gostar
do próprio dever. A não
ser que a pessoa encontre nela mesma o gosto daquilo que faz e cada dia
renove o seu compromisso. Aqueles homens eram atraídos demais por
prazeres exteriores para procurar razões interiores. Nunca mais ninguém
subiu ao monte para conferir. A pedra ainda está
lá, mas já desceu um bom metro rumo ao vale.
No
início do tempo de Advento, recomeçando o ano litúrgico, somos
convidados sempre a ficar atentos e a vigiar. Podemos pensar em coisas
pavorosas, mas não é para tanto.
Seria suficiente pensar em nossa vida que passa. Ninguém de nós sabe o
que nos reserva o futuro. Como sempre serão alegrias e tristezas,
momentos bons e momentos difíceis. A nossa vida é uma mistura de tudo
isso.
Estar
atentos, portanto, pode significar simplesmente dar atenção ao que está
acontecendo e saber reconhecer a presença do Senhor que veio no meio de
nós, mas sempre vem
para oferecer o seu amor a todos. Pensamos nas situações da vida, mas
também nas oportunidades que ela nos oferece. Pessoas que encontramos
pelos caminhos do mundo; gestos e ações de bem, de bondade, paz e
justiça que podemos realizar.
Vigiar,
diz-nos o evangelho deste domingo, é fazer de tudo para não nos tornar
“insensíveis por causa da gula, da embriaguez e das preocupações da
vida”. Parece o retrato
da nossa sociedade: todos tão atarefados, tão preocupados, correndo o
dia todo, porém cada um atrás dos seus interesses, com a sensibilidade
e, portanto, com a consciência entorpecida. Acordamos quando acontece
algo de grave e de sério para nós. Se depois
é questão de dinheiro, somos supersensíveis. Brigamos até o fim.
Raramente nos deixamos envolver com as dificuldades dos irmãos. Falar em
bem comum é discurso para candidato idealista; poucas vezes é fruto de
uma consciência de cidadania unida à vontade de
resolver os problemas juntos, assumindo a responsabilidade, também
pessoal, de construir uma sociedade mais justa e fraterna.
O
mistério do Natal de Jesus nos lembra da sensibilidade de Deus que
continua vendo e ouvindo os clamores do seu povo e decide estar ao lado
do pequeno e do pobre, de todo
ser humano que deixa de lado o orgulho e reconhece a sua finitude.
Somente assim acontece o encontro entre o amor de Deus e a nossa sede de
amor. Também naquele tempo os insensíveis, seguros de si, não souberam
acolher o Salvador. No entanto é com ele, o Senhor
que vem, que sempre aprendemos de novo quanto vale ter um coração
sensível e amoroso.
Ficamos
sempre atentos, vigiando para nós e para os outros também, antes que a
pedra gigantesca do egoísmo e da insensibilidade nos faça parecer inútil
amar. Neste caso,
a pedra já teria destruído a nossa vida, porque teria rolado do monte
até parar em nosso coração. Talvez sem perceber.
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