sábado, 17 de março de 2012

São Gregório Nazianzeno, mestre na fé da Trindade



Segunda Pregação de Quaresma
Em anos não distantes, tem-se havido propostas teológicas que, apesar das profundas diferenças entre elas, tinham um esquema de fundo comum, às vezes claro, às vezes implícito. Tal esquema é muito simples, porque redutivo. Os dois maiores mistérios da nossa fé são a Trindade e a Encarnação: Deus é uno e trino; Jesus Cristo é Deus e homem. A essência das propostas às quais me refiro diz assim: Deus é uno, e Jesus Cristo é homem. Cai a divindade de Cristo e, com essa, a Trindade.
O resultado deste processo é que acaba-se aceitando tacitamente e hipocritamente a existência de duas fé e de dois cristianismos diferentes, que só têm o nome em comum: o cristianismo do Credo da Igreja, das declarações ecumênicas conjuntas, nas quais, com as palavras do símbolo Niceno-Constantinopolitano, continua a professar a fé na Santíssima Trindade e na plena divindade de Cristo, e o cristianismo de grandes segmentos da cultura, também exegética e teológica, nas quais estas mesmas verdades são ignoradas ou interpretadas de forma bastante diferente.
Neste clima, é particularmente oportuna uma revisitação dos Padres da Igreja, não só para conhecer o conteúdo do dogma no seu estado nascente, mas ainda mais para reencontrar a unidade entre a fé professada e a fé vivida, entre a “coisa” e o seu “enunciado”. Para os Padres a Trindade e a unidade de Deus, a dualidade das naturezas e a unicidade da pessoa de Cristo não eram verdades para se discutir na teoria somente ou nos livros em diálogo com outros livros; eram realidade vitais. Parafraseando uma piada que circula nos ambientes esportivos, poderemos dizer que tais verdades não eram para eles questão de vida ou de morte; eram muito mais!
1. Gregório Nazianzeno, cantor da Trindade
O gigante sobre o qual queremos subir nas costas hoje, é São Gregório Nazianzeno, o horizonte que queremos vasculhar com ele é a Trindade. É seu o grandioso quadro que mostra o desdobrar-se da revelação da Trindade na história e a pedagogia de Deus que se revela nele. O Antigo Testamento, escreve, proclama abertamente a existência do Pai e começa a anunciar veladamente aquela do Filho; O Novo Testamento proclama abertamente o Filho e começa a revelar a divindade do Espírito Santo; agora, na Igreja, o Espírito nos concede distintamente a sua manifestação e se confessa a glória da beata Trindade. Deus dosou a sua manifestação, adaptando-a aos tempos e à capacidade receptiva dos homens (Cf. Gregorio Nazianzeno, Oratio 31, 26. Trad. portuguesa nossa, Trad ital di C. Moreschini, I cinque discorsi teologici, Roma, Città Nuova, 1986).
Esta divisão tríplice não tem nada a ver com a tese, conhecida sob o nome de Joaquim de Fiore, dos três períodos distintos: aquele do Pai, no Antigo Testamento, aquele do Filho no Novo e aquele do Espírito na Igreja. A distinção de São Gregório se coloca na ordem da manifestação, não do ser ou do agir das Três Pessoas, que estão presentes e obram juntas em todo o arco do tempo.
São Gregório Nazianzeno recebeu da tradição o título de “o Teólogo” (Rô Theólogos), justo por causa da sua contribuição para a compreensão do dogma trinitário. O seu mérito foi ter dado à ortodoxia trinitária a sua formulação perfeita, com frases destinadas à se tornarem patrimônio comum da teologia. O símbolo pseudo-atanasiano “Quicumque”, composto aproximadamente um século depois, deve bastante à Gregório Nazianzeno.
Eis algumas das suas fórmulas cristalinas: “Era, e era, e era: mas era um só. Luz e luz e luz: mas uma só luz. Isto é o que David imaginou quando disse: “Na tua luz veremos a luz” (Sl 35,10). E agora nós a contemplamos e a anunciamos, da luz que é o Pai compreendendo a luz que é o Filho na luz do Espírito: Eis a breve e concisa teologia da Trindade [...] Deus, se é que podemos falar de forma sucinta, é indivisível em seres divisíveis uns dos outros”( Oratio 31, 3.14).
A principal contribuição dos Capadócios na formulação do dogma trinitário é aquela de ter levado até o fim a distinção dos dois conceitos de ousia e hipostase, substância e pessoa, criando a base conceitual permanente com a qual se exprime a fé na Trindade. Trata-se de uma das maiores inovações que a teologia cristã introduziu no pensamento humano. Dessa foi possível se desenvolver o moderno conceito de pessoa como relação. O lado fraco da sua teologia trinitária, e que ele mesmo se deu conta, era o perigo de conceber a relação entre a única substância divina e as três hipósteses do Pai, do Filho e do Espírito Santo da mesma forma que a relação que existe na natureza entre as espécies e os indivíduos (Por exemplo, entre a espécie humana e os indivíduos homens), expondo-se assim às acusações de triteísmo (Cf. Basilio, Epistola 236,6).
Gregorio Nazianzeno se esforça para responder a esta dificuldade, dizendo que cada uma das três pessoas divinas não é menos unida às outras duas do que é unida a si mesma (Gregorio Naz., Oratio. 31,16). Rejeita, pelo mesmo motivo, as semelhanças tradicionais de “fonte, riacho, rio” ou “sol, raio, luz”( Ib. 31, 31-33). Ao final admite, porém, candidamente que prefere esse risco ao do modalismo: “É melhor, diz ele, ter uma idéia, talvez insuficiente, da união dos Três, do que ousar uma impiedade absoluta” (Ib. 31, 12).
Por que escolher São Gregório Nazianzeno como mestre de fé na Trindade? O motivo é o mesmo pelo qual escolhemos Atanásio como mestre de fé na divindade de Cristo. É que, para Gregório, a Trindade não é uma verdade abstrata, ou apenas um dogma; é a sua paixão, o seu ambiente vital, algo que vibra o seu coração só com a menção.
Os ortodoxos chamam-no de “o cantor da Trindade”. Isto corresponde perfeitamente ao que sabemos da sua personalidade humana. O Nazianzeno é um homem com um coração maior do que a mente, um temperamento exageradamente sensível, de modo a causar-lhe não poucos sofrimentos e decepções nos seus relacionamentos com os outros, começando com o seu amigo São Basílio.
É na sua produção poética que se revela sobretudo o seu entusiasmo pela Trindade. Ele usa expressões como “a minha Trindade”, “a amada Trindade” [Gregorio Naz., Poemata de seipso, I,15; I, 87 (PG 37, 1251 s.; 1434)]. Gregorio é um apaixonado da Trindade. Escreve sobre si mesmo:
“Desde o dia em que eu renunciei as coisas deste mundo para consagrar a minha alma às contemplações luminosas e celestiais, quando a inteligência suprema me seqüestrou daqui de baixo para colocar-me distante de tudo o que é carnal, daquele dia os meus olhos foram ofuscados pela luz da Trindade … Da sua sublime sede ela espalha sobre todas as coisas o seu brilho inefável… A partir daquele dia eu estou morto para o mundo e o mundo está morto para mim” [Ib., I,1 (PG 37, 984-985)].
Basta comparar estas palavras com as expressões tecnicamente perfeitas, mas frias do símbolo “Quicumque”, que se recitava a um tempo atrás no Ofício divino do domingo, para que nos demos conta da distância que separa a fé vivida pelos Padres daquela formal e repetitiva que se instaura depois deles, ainda se esta última absolve também uma tarefa importante.
2. Não podemos viver sem a Trindade
Agora, como sempre, algumas reflexões sobre aquilo que os Padres podem oferecer-nos, neste campo, para uma renovação da nossa fé. Sabemos que a teologia ocidental sempre teve de se defender contra o risco do triteísmo do qual, temos visto, deve defender-se o Nazianzeno; o risco de enfatizar a unidade da natureza divina, em detrimento da distinção das pessoas.
Sobre este terreno foi possível se desenvolver a visão deística de Descartes e dos Iluministas que prescinde totalmente da Trindade para concentrar-se unicamente em Deus, concebido como Ser supremo ou como “a divindade”. Kant chegou com isso à famosa conclusão de que “da doutrina Trinitária, tomada literalmente, não é possível tirar nada de prático” (E. Kant, Il conflitto delle facoltà, A 50 (WW, ed. W. Weischedel, VI, p.303). Ela, em outras palavras, seria irrelevante para a vida dos homens e da Igreja.
Isto foi sem dúvida um dos fatores que aplainou o caminho do ateísmo moderno. Se tivesse permanecido viva na teologia a idéia do Deus Uno e Trino, antes de falar de um vago “Ser supremo”, não teria sido muito fácil para Feurbach fazer triunfar a sua tese de que Deus é uma projeção que o homem faz de si mesmo e da própria essência. Que necessidade teria então o homem de dividir-se em três: em Pai, Filho e Espírito Santo? E em que sentido a Trindade pode ser a projeção e a sublimação que o espírito humano faz de si mesmo? É o vago deísmo que foi demolido por Feuerbach, não a fé no Deus uno e trino.
Mas se a visão latina da Trindade, por um lado, abre brecha para este desvio deístico, por outro lado contém o remédio mais eficaz contra ele. Nunca seremos o suficientemente gratos a Agostinho por ter feito o seu discurso da Trindade sobre a palavra de João: “Deus é amor” (1 Jo 4,10). Deus é amor: por isso, conclui Agostinho, ele é Trindade! “O amor supõe um que ama, o que é amado e o mesmo amor”( Agostino, De Trinitate, VIII, 10, 14). O Pai é, na Trindade, aquele que ama, a fonte e o princípio de tudo; o filho é aquele que é amado; o Espírito Santo é o amor com o qual se amam.
Todo amor é amor de alguém ou de algo, como todo conhecimento, explicou Husserl, é conhecimento de algo. Não existe um amor “vazio”, sem objeto. Ora, quem ama a Deus, para ser definido amor? O Homem? Mas então é amor só de apenas algumas centenas de milhões de anos. O universo? Mas então é amor somente de algumas poucas dezenas de bilhões de anos. E antes quem amava a Deus para ser amor? Os pensadores gregos e, em geral, as filosofias religiosas de todos os tempos, concebendo a Deus principalmente como um “pensamento”, podiam responder: Deus pensava a si mesmo; era “pensamento puro”, “pensamento de pensamento”. Mas isto não é possível, no momento em que se diz que Deus é antes de mais nada amor, porque o “puro amor de si mesmo” seria então puro egoísmo, que não é exaltação máxima do amor, mas a sua total negação.
E aqui está a resposta da revelação, explicitada pela Igreja com a sua doutrina da Trindade. Deus é amor desde sempre, ab aeterno, porque antes mesmo de que existisse um objeto fora de si para amar, tinha em si mesmo o Verbo, o Filho que amava com amor infinito, ou seja “no Espírito Santo”. Isso não explica como a unidade possa ser simultaneamente trindade (isso é um mistério incognocível por nós porque acontece somente em Deus), mas nos é suficiente, ao menos, intuir porque, em Deus, a unidade deve ser também pluralidade, também trindade.
Um Deus que fosse puro Conhecimento ou pura Lei, ou puro Poder não teria certamente necessidade de ser trino (este fato complicaria ainda mais as coisas); mas um Deus que é acima de tudo Amor sim, porque “em menos de dois, não pode haver amor”. “É necessário – escreveu de Lubac – que o mundo conheça: a revelação do Deus Amor perturba todo o conceito que ele tinha da divindade” (H. de Lubac, Histoire et Esprit, Aubier, Parigi 1950, cap.5).
Aquela do amor é certamente uma analogia humana, mas é sem dúvida aquela que melhor nos permite vislumbrar as profundezas misteriosas de Deus. Nisso se vê como a teologia latina integra aquela grega e as duas não podem dispensar-se mutuamente. O tema do amor está quase inteiramente ausente na teologia trinitária dos orientais que usam de preferência a analogia da luz. É necessário esperar Gregório Palamas para ler, no âmbito grego, algo análogo do que disse Agostinho sobre o amor na Trindade [Gregorio Palamas, Capita physica, 36 (PG 150, 1144s)].
Alguns gostariam de colocar hoje entre parênteses o dogma da Trindade para facilitar o diálogo com as outras grandes religiões monoteístas. É uma operação suicida. Seria como tirar a espinha dorsal de uma pessoa para fazê-la caminhar mais facilmente! A Trindade está tão impressa na teologia, liturgia, espiritualidade e toda a vida cristã que renunciar a ela significaria iniciar uma outra religião, completamente diferente.
O que deve ser feito é, antes, como os Padres nos ensinam, tirar esse mistério dos livros de teologia e colocá-los na vida, de modo que a Trindade não seja só um mistério estudado e formulado corretamente, mas vivido, adorado, gozado. A vida cristã se desenvolve, do começo ao fim, no sinal e na presença da Trindade. Na aurora da vida, fomos batizados “em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo” e, no final, se tivermos a graça de uma morte cristã, ao nosso lado serão pronunciadas estas palavras: “Parte, alma cristã, deste mundo: em nome do Pai que te criou, do Filho que te redimiu e do Espírito Santo que te santificou”.
Entre estes dois momentos extremos, são colocados outros momentos assim chamados “de passagem” que, para um cristão, são marcados pela invocação da Trindade. Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo os esposos são unidos em matrimônio e se trocam o anel e os sacerdotes e os bispos são consagrados. Em nome da Trindade iniciavam uma vez os contratos, as sentenças e cada ato importante da vida civil e religiosa. A Trindade é o ventre do qual nascemos (cf. Ef 1,4) e é também o porto para o qual todos navegamos. É “o oceano de paz” do qual tudo jorra e no qual tudo flui
3. “O beata Trinitas!”
São Gregório Nazianzeno deveria ter suscitado em nós o desejo ardente da Trindade: fazer dela a “nossa” Trindade, a “amada” Trindade, a “cara” Trindade. Alguns desses toques de sincera adoração e espanto sobressaem nos textos da solenidade da Santíssima Trindade. Devemos fazê-los passar da liturgia para a vida. Existe algo mais santo que podemos fazer com relação à Trindade do que buscar compreendê-la, e é entrar nela! Não podemos abraçar o oceano, mas podemos entrar nele; não podemos abraçar o mistério da Trindade com a nossa mente, mas podemos entrar nele!
A “porta” para entrar na Trindade é só uma, Jesus Cristo. Com a sua morte e ressurreição ele inaugurou para nós um caminho novo e vivente para entrar no santo dos santos que é a Trindade (cf. Hb 10,19-20) e deixou-nos os meios para poder segui-lo nesta viagem de retorno . O primeiro e mais universal é a Igreja. Quando se quer atraversar um braço de mar, dizia Agostinho, a coisa mais importante não é estar na margem e aguçar a visão para ver o que há do outro lado, mas é subir na barca que leva até a margem. E também para nós a coisa mais importante não é especular sobre a Trindade, mas permanecer na fé da Igreja que vai em direção a ela (Agostino, De Trinitate, IV,15,30; Confessioni, VII, 21).
Na Igreja, a Eucaristia é o meio por excelência. A Missa é uma ação trinitária do início ao fim; começa em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo e termina com a benção do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Essa é a oferta que Jesus, cabeça e corpo místico, faz de Si mesmo ao Pai no Espírito Santo. Através dele, entramos realmente no coração da Trindade.
Para os irmãos ortodoxos, um importante meio para entrar no mistério é o ícone. A Trindade de Rublev é uma síntese visual da doutrina trinitária dos Capadócios, particularmente de Gregório Nazianzeno. Nela percebe-se, em igual medida, movimento incessante e quietude sobre-humana, transcendência e condescendência. O dogma da unidade e trindade de Deus é expresso pelo fato de que as figuras presentes são três e bem distintas, mas muito semelhantes entre elas. Estão idealmente contidas dentro de um círculo que destaca a sua unidade; mas com o seu diverso movimento e disposição proclamam também a sua distinção. O santo, cujo mosteiro foi pintado o ícone, São Sérgio de Radonez, havia se distinguido na história Rússa por ter trazido a unidade entre os líderes em desacordo entre si e de ter tornado assim possível a libertação da Rússia pelos Tártaros que a tinham invadido. O seu lema – que Rublev tem se esforçado para interpretar o ícone – era: “Contemplando a Santíssima Trindade, vencer a discórdia ódiosa deste mundo.” São Gregório Nazianzeno tinha expressado um pensamento semelhante nestes versos que parecem o seu testamento espiritual:
Busco a solidão, um lugar inacessível para o mal,
Onde com mente única buscar o meu Deus
E aliviar a minha velhice com a doce esperança do céu.
O que vou deixar à Igreja? Vou deixar as minhas lágrimas! …
Dirijo o meu pensamento para a morada que não conhece ocaso,
Para a minha querida Trindade, única luz,
Da qual só a sombra escura me comove agora. ”
A espiritualidade latina não é menos rica de ajuda para fazer da Trindade um mistério próximo, amado. Ela também insiste sobre o movimento oposto: não nós que entramos na Trindade, mas a Trindade entraem nós. Natradição ortodoxa, a doutrina da inabitação é referida de preferência à pessoa do Espírito Santo. É a teologia latina que desenvolveu, em todo o seu potencial, a doutrina bíblica da inabitação de toda a Trindade na alma: “O meu Pai o amará e a ele viremos e nele estabeleceremos morada”. (Jo 14, 23). Pio XII reservou para ela um lugar na sua Mystici Corporis, dizendo que graças a ela nós “participamos desde agora na alegria e na bem aventurança da Trindade”.
São João da Cruz diz que “o amor foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo” (Rm 5,5) não é nada mais do que o amor com o qual o Pai, desde sempre, ama o Filho. É um transbordamento do amor divino da Trindade para nós. Deus comunica à alma “o mesmo amor que comunica ao Filho, mesmo que isso não ocorra naturalmente, mas por união… A alma participa de Deus, cumprindo, junto com ele, a obra da Santíssima Trindade”. A beata Elizabete da Trindade nos sugere um método simples para traduzir tudo isso num programa de vida: “Todo o meu exercício consiste em entrar em mim mesma e perder-me nos Três que estão lá”.
Eu vejo nisso uma razão a mais, e entre as mais profundas, para evangelizar. Lia dias atrás, na liturgia das horas, as palavras de Deus em Isaías: “Eis para quem estão voltados meus olhos: para quem é humilde, que tem o espírito aflito e trema diante da minha palavra” (Isaías 66,2). Fiquei impressionado com um pensamento. Eis, disse a mim mesmo, em que consiste a grande diferença entre quem é batizado e quem não o é: sobre quem é batizado, Deus “dirige o olhar”, está presente intencionalmente, com o seu amor e a sua providência; em quem é batizado, ele não dirigem somente o olhar mas vem habitar nele pessoalmente, e mais com todas as três Pessoas divinas. É verdade que uma presença intencional correspondida pode ser mais aceitável a Deus do que uma presença batismal negligenciada ou recusada (e isso deve encher-nos de humildade e responsabilidade), mas seria ingratidão não reconhecer a diferença que faz ser ou não ser cristãos.
Terminamos a recitando juntos a doxologia que conclui o cânon da Missa e que constitui a mais breve e a mais densa oração trinitária da Igreja: “Por Cristo, com Cristo, em Cristo, a vós, Deus Pai Todopoderoso, na unidade do Espírito Santo,Toda honra e Toda a Glória agora e para sempre. Amém”.
16 de março de 2012
[Tradução Thácio Siqueira]

quinta-feira, 15 de março de 2012

Novena a São José - Festa litúrgica do dia 19 de Março




Tenho uma devoção especial por São José, pai adotivo de Nosso Senhor Jesus Cristo. Poucos as Sagradas Escrituras falam sobre ele, e quando o apresentam, referem-se na verdade as figuras de Nosso Senhor e da Virgem Maria. Mas José, o justo, foi fundamental para nossa História da Salvação como nos lembram o Evangelho.
A diocese de Macapá, é dedicada a este justo homem. Minha esposa, Simone Farias, e eu estamos fazendo a Novena de São José, clamando a providência de Deus diante das adversidades que se tem apresentado. Confiantes, pedimos a intercessão deste Santo, protetor da Sagrada Família de Nazaré e Patrono da Igreja Universal.


NOVENA A SÃO JOSÉ – FESTA LITÚRGICA DO DIA 19 DE MARÇO
Nota: Esta oração foi encontrada no quinquagésimo ano de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Em 1505 ela foi enviada pelo Papa ao Imperador Carlos quando ele estava indo para uma batalha. Quem quer que leia esta oração ou a escute ou a mantenha junto de si jamais deverá morrer de morte repentina, ou ser afogado, nem mesmo veneno fará mal algum a eles; e muito menos cairão eles nas garras do inimigo, ou se queimarão em alguma chama ou serão mortos em batalha. Diga esta oração por nove manhãs para obter alguma graça que você deseje. Não há registro de que tenha falhado alguma vez, então, certifique-se de que realmente deseja o que irá pedir.
1 - ORAÇÕES INICIAIS PARA TODOS OS DIAS
Oh! São José, cuja proteção é tão grande, tão forte, tão imediata diante do trono de Deus, coloco em vossas mãos todos os meus interesses e desejos. Oh! São José, auxilie-me com sua poderosa intercessão, e obtenha para mim do seu divino Filho todas as bênçãos espirituais, por intermédio de Jesus Cristo, nosso Senhor, para que, tendo-me comprometido aqui, sob seu poder celestial, eu possa oferecer minhas graças e homenagens ao mais amável dos Pais. Oh São José, jamais me canso de contemplar a ti e a Jesus a dormir em seus braços; Não me atrevo a me aproximar enquanto Ele repousa junto do teu coração. Abraçe-O em meu nome e beije-O ao meu último suspiro.
São José, Patrono das almas partidas
Rogai por mim.

Em nome do Pai, do Filho, e do Espírito Santo.
Amém e Amém.

Oh glorioso São José, fiel seguidor de Jesus Cristo, a ti elevamos nossos corações e nossas mãos para implorar vossa poderosa intercessão em obter do benigno coração de Jesus todos os auxílios e graças necessárias ao nosso bem-estar espiritual e carnal, particularmente pela graça de uma morte feliz e o especial favor que agora vos pedimos (mencionar pedidos, intenções).
Oh! guardião dos encarnados do mundo, sentimo-nos animados e confiantes de que vossas orações em nosso favor serão graciosamente ouvidas ao trono de Deus.
Oh! glorioso São José, pelo amor que tendes por Jesus Cristo e pela glória do Seu nome, escutai as nossas orações e dai-nos o que pedimos. Amém.
2 - PRIMEIRO DIA
Oh! glorioso São José, com sentimentos de inlimitada confiança, vos imploramos que abençoe esta novena que começamos em vossa honra.
"Vós jamais sois invocado em vão" dizia Santa Teresa do Menino Jesus.
Fazei por mim, portanto, o mesmo o que fizestes pela esposa do Sagrado Coração de Jesus e graciosamente escutai-me assim como a ela escutou. Amém.
São José, rogai por nós!
3 - SEGUNDO DIA
Oh! abençoado São José, pai carinhoso, fiel guardião de Jesus, casto esposo da Mãe de Deus, nós oramos e vos imploramos que ofereça a Deus, o Pai, Seu divino filho, banhado em sangue na Cruz por nós, pecadores, e pelo trino nome sagrado de Jesus obtenhais do Pai eterno o favor pelo qual imploramos vossa intercessão
(mencionar pedido).
Pelos esplendores da eternidade, não vos esqueçais das dores daqueles que rezam, daqueles que choram;
Permitai que, através de vossas orações e as de vossa sacratíssima esposa, o Coração de Jesus seja comovido à piedade e ao perdão. Amém.
São José, rogai por nós!
4 - TERCEIRO DIA
Abençoado São José, acendei em nossos gélidos corações uma faísca da vossa caridade.
Que Deus seja sempre o primeiro e único objeto de nossas afeições.
Mantenha nossas almas sempre na graça santificada e, se tivermos a infelicidade de perdê-la, dai-nos a força para repô-la imediatamente através de sincero arrependimento.
Ajudai-nos para que o amor de nosso Deus nos mantenha sempre unidos a Ele. Amém.
Oh! glorioso São José, pelo amor que tendes por Jesus Cristo e pela glória de Seu nome, escutai as nossas preces e concedei-nos o que vos pedimos.
São José, rogai por nós!

5 - QUARTO DIA
São José, orgulho do Céu, esperança infalível para nossas vidas, e apoio àqueles na terra, graciosamente aceitai nossa oração de louvor.
Fostes nomeado esposo da casta Virgem pelo Criador do mundo.
Ele quis que vós fôsseis chamado "pai" do Mundo e nos servisse como agente de nossa salvação.
Que o Deus trino que outorgou a vós honras celestiais, seja louvado para sempre.
E que Ele nos conceda pelos vossos méritos o gozo da vida abençoada e uma favorável resposta aos nossos pedidos. Amém.
São José, rogai por nós!
6 - QUINTO DIA
Oh! sagrado São José, que lição vossa vida é para nós, somos sempre tão ávidos por aparecer, tão ansiosos para ostentar aos olhos dos homens as graças que devemos inteiramente à liberalidade de Deus.
Além do favor especial pelo qual declaramos nesta novena (mencionar pedido), concedei que possamos atribuir a Deus a glória de todas as coisas, que amemos a vida humilde e silenciosa, que não desejemos nenhuma outra posição senão a que nos foi concedida pela Providência e que sempre sejamos dóceis intrumentos nas mãos de Deus. Amém.
São José, rogai por nós!
7 - SEXTO DIA
Oh! glorioso São José, nomeado pelo Pai Eterno como o guardião e protetor da vida de Jesus Cristo, o conforto e o apoio de Sua Sagrada Mãe, e o instrumento em Seu grande propósito para a redenção da humanidade; vós que tivésseis a felicidade de viver com Jesus e Maria, e de morrer em Seus braços, sê comovido pela confiança que depositamos em vós, e obtenha para nós, do Todo Poderoso, o favor particular que humildemente pedimos pela vossa intercessão (mencionar pedido). Amém.
São José, rogai por nós!
8 - SÉTIMO DIA
Oh! fiel e prudente São José, vigiai nossa fraqueza e nossa inexperiência; concedei-nos a prudência que nos faz lembrar de nosso fim, que dirige nossos passos e nos protege de todo perigo.
Rogai por nós, então, Oh grande Santo, e através de seu amor por Jesus e Maria, e do Seu amor por vós, concedei o favor que vos pedimos nesta novena (mencionar pedido). Amém.
São José, rogai por nós!
9 - OITAVO DIA
Oh! abençoado José, a quem foi concedido não apenas ver e ouvir o Deus que muitos reis ansiaram em ver e não viram;
Ouvir e não ouviram; mas também carregá-Lo em vossos braços, abraçá-Lo, vesti-Lo, e guardar e defendê-Lo, vinde em nosso auxílio e intercedei junto a Ele para olhar favoravelmente nosso pedido (mencionar pedido). Amém.
São José, rogai por nós!
10 - NONO DIA
Oh! bondoso São José, ajudai-nos a ser como vós, amável com aqueles cuja fraqueza sustenta-se sobre eles;
Ajudai-nos a dar àqueles que buscam vosso auxílio, a força para que eles permaneçam inabaláveis.
Dai-nos vossa fé, que possamos ver o verdadeiro brilho sobre as vitórias das forças do bem.
Dai-nos vossa esperança para que permaneçamos seguros, intocáveis pela dúvida, firmes para suportar.
Concedei-nos vosso amor que, enquanto os anos aumentarem, que um coração compreensivo traga-nos paz.
Permitai-nos vossa pureza que, a hora da morte encontre-nos intocados pelo sopro do mal.
Permitai vosso amor de operário que não recusemos a vida que nos chama ao trabalho honesto.
Dai-nos vosso amor de pobreza para que vivamos satisfeitos, independente da riqueza.
Dai-nos vossa coragem para que sejamos fortes;
Dai-nos vossa mansidão para confessar nossos pecados.
Dai-nos vossa paciência para qe possamos possuir o reinos de nossas almas sem angústia.
Ajudai-nos, querido Santo, a viver para que, quando morrermos possamos passar convosco para junto de Jesus e Seus amigos.
Oh! Gloriosos São José, escutai as nossas preces e intercedei pelos nossos pedidos. Amém.
São José, rogai por nós!

ORAÇÕES PARA TODOS OS DIAS

11 - APÓS ORAÇÃO DO DIA: PROCLAMAR UMA LEITURA BÍBLICA ( a escolha)

12 - ORAÇÃO A SÃO JOSÉ II

A vós São José, recorremos na nossa tribulação, e depois de ter implorado o auxílio da vossa Santíssima Esposa, cheios de confiança, solicitamos o vosso patrocínio.
Por esse laço sagrado de caridade que vos uniu à Virgem Imaculada Mãe de Deus, e pelo amor paternal que tivestes para com o Menino Jesus, ardentemente suplicamos que lanceis um olhar benigno à herança que Jesus Cristo conquistou com o seu Sangue, e nos assistais, nas nossas necessidades, com o vosso auxílio e poder.
Protegei, oh! guarda providente da Divina Família, a raça escolhida de Jesus Cristo;
Afastai para longe de nós, oh! Pai amantíssimo, a peste do erro e do vício; assisti-nos do alto do céu, oh! nosso fortíssimo sustentáculo, na luta contra o poder das trevas;
E, assim como outrora salvastes da morte a vida ameaçada, do Menino Jesus assim também defendei agora a Santa Igreja de Deus contra as ciladas dos seus inimigos e contra toda a adversidade.
Amparai a cada um de nós, com vosso constante patrocínio, a fim de que a vosso exemplo e sustentados com o vosso auxílio, possamos viver virtuosamente, piedosamente morrer, e obter no Céu a eterna bem-aventurança. Amém
13 - LADAINHA DE SÃO JOSÉ (orar a Ladainha)
Senhor, tende piedade de nós.
Jesus Cristo, tende piedade de nós.
Senhor, tende piedade de nós.
Jesus Cristo, ouvi-nos.
Jesus Cristo, atendei-nos.
Deus Pai, tende piedade de nós.
Deus Filho, Redentor do Mundo, tende piedade de nós.
Deus Espírito Santo, tende piedade de nós.
Santíssima Trindade, que sois um só Deus, tende piedade de nós.
Santa Maria, rogai por nós.
São José, rogai por nós.
Ilustre descendente de Davi, rogai por nós.
Luz dos Patriarcas, rogai por nós.
Esposo da Mãe de Deus, rogai por nós.
Guarda da Virgem pura, rogai por nós.
Pai nutrício do Filho de Deus, rogai por nós.
Insigne defensor de Cristo, rogai por nós.
Chefe da Sagrada Família, rogai por nós.
José justíssimo, rogai por nós.
José castíssimo, rogai por nós.
José prudentíssimo, rogai por nós.
José fortíssimo, rogai por nós.
José obedientíssimo, rogai por nós.
José fidelíssimo, rogai por nós.
Espelho de paciência, rogai por nós.
Amador da pobreza, rogai por nós.
Modelo dos operários, rogai por nós.
Honra da vida doméstica, rogai por nós.
Guarda das virgens, rogai por nós.
Amparo das famílias, rogai por nós.
Alívio dos infelizes, rogai por nós.
Esperança dos enfermos, rogai por nós.
Padroeiro dos moribundos, rogai por nós.
Terror dos demônios, rogai por nós.
Protetor da Santa Igreja, rogai por nós.
Cordeiro de Deus, que tirais o pecado do mundo, perdoai-nos Senhor.
Cordeiro de Deus que tirais o pecado do mundo, ouvi-nos Senhor.
Cordeiro de Deus que tirais o pecado do mundo, tende piedade de nós.
"Deus o constituiu Senhor de sua casa.
E príncipe de toda a posteridade."

Oremos:

Oh! Deus, que, por uma infalível providência, vos dignastes escolher o bem-aventurado São José para Esposo de Vossa Mãe Santíssima, concedei-nos que aquele mesmo, que na Terra veneramos como protetor, mereçamos tê-lo no Céu, como intercessor.
Vós que viveis e reinais por todos os séculos dos séculos. Amém.

14 - INVOCAÇÃO A SÃO JOSÉ

"São José, guardião de Jesus e casto esposo de Maria, empenhaste toda vossa vida no perfeito comprimento de vosso dever, vos mantiveste a Sagrada família de Nazaré com o trabalho de vossas mãos.
Protegei bondosamente aos que recorrem confiadamente a vós.
Vós conheces nossas aspirações e nossas esperanças.
Se dirigem a vos porque sabem que vos os compreendes e proteges.
Vós também conheces as provas, dificuldades e trabalhos.
Mas, ainda dentro das preocupações materiais da vida, vossa alma estava cheia de profunda paz e cantou cheio de verdadeira alegria pelo intimo trato que tinhas com o Filho de Deus, o qual vos foi confiado e também a Maria, sua terna Mãe. Amém." João XXIII
15 - LOUVOR ESPONTANEO A SANTISSÍSIMA TRINDADE PELOS MÉRITOS DE SÃO JOSÉ
Orar o Pai-Nosso; e o Vinde, Espírito Santo!
16 - INVOCAÇÃO A VIRGEM MARIA, ESPOSA CASTISSIMA DE SÃO JOSÉ
Orar três Ave-Maria;

17 - CONSAGRAÇÃO A SÃO JOSÉ

Oh! Glorioso Patriarca São José, eis-me aqui, prostrado de joelhos ante vossa presença, para pedir-vos vossa proteção.Desde já vos elejo como meu pai, protetor e guia. Sob vosso amparo ponho meu corpo e minha alma, propriedade, vida e saúde.Aceitai-me como filho vosso.Preservai-me de todos os perigos, ataques e laços do inimigo.Assisti-me em todo momento e sobre tudo na hora de minha morte. Amém.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

O Fundamentalismo Ateu




SÃO PAULO, 18 de janeiro de 2012(ZENIT.org) - Oferecemos aos nossos leitores, um interessante artigo que nos enviou *Ives Gandra da Silva Martins, advogado tributarista, professor e prestigiado jurista brasileiro; uma reflexão sobre o valor das religiões.
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O FUNDAMENTALISMO ATEU
Voltávamos,Francisco Rezeke eu, de uma posse acadêmica em Belo Horizonte, quando ele utilizou a expressão “fundamentalismo ateu” para referir-se ao ataque orquestrado aos valores das grandes religiões que vivemos na atualidade.
Lembro-me de conversa telefônica que tive com o meu saudoso e querido amigo Octávio Frias, quando discutíamos um editorial que estava para ser publicado, sobre Encíclica do Papa João Paulo II, do qual discordava quanto a alguns temas. Argumentei que a Encíclica era destinada aos católicos e que quem não o era, não deveria se preocupar. Com sua inteligência, perspicácia e bom senso Frias manteve o editorial, mas acrescentou a observação de que o Papa, embora cuidando de temas universais, dirigia-se, fundamentalmente, aos que tinham a fé cristã.
Quando fui sustentar, pela CNBB, perante a Suprema Corte, a inconstitucionalidade da destruição de embriões para fins de pesquisa científica - pois são seres humanos, já que a vida começa na concepção -, antes da sustentação fui hostilizado, a pretexto de que a Igreja Católica seria contrária a Ciência e que iria falar de religião e não de Ciência e de Direito. Fui obrigado a começar a sustentação informando que a Academia de Ciências do Vaticano tinha, na ocasião, 29 Prêmios Nobel, enquanto o Brasil até hoje não tem nenhum, razão pela qual só falaria de Ciência e de Direito. Mostrei todo o apoio emprestado pela Academia às experiências com células tronco adultas, que estavam sendo bem sucedidas, enquanto havia um fracasso absoluto nas experiências com células tronco embrionárias. E, de lá para cá, o sucesso com as experiências, utilizando células tronco adultas, continua cada vez mais espetacular. Já as pesquisas com células embrionárias permanecem no seu estágio “embrionário”.
Trago estas reminiscências, de velho advogado provinciano, para demonstrar minha permanente surpresa com todos aqueles que, sem acreditarem em Deus, sentem necessidade de atacar permanentemente os que acreditam nos valores próprios das grandes religiões, que como diz Toynbee,em seu “Estudoda História”, terminaram por conformar as grandes civilizações. Por outro lado, Thomas E. Woods Jr., em seu livro “Como a Igreja Católica construiu a civilização Ocidental” demonstra que, além dos fantásticos avanços na Ciência realizados por sacerdotes cientistas, a Igreja ofereceu ao mundo moderno o seu maior instrumento de cultura e educação, ou seja, a Universidade.
Aos que direcionam esta guerra atéia contra aqueles que vivenciam a fé cristã e cumprem seu papel, nas mais variadas atividades, buscando a construção de um mundo melhor, creio que a expressão do ex-juiz da Corte de Haia é adequada. Só não se assemelham aos “fundamentalistas” do Próximo Oriente, porque não há terroristas entre eles.
Num Estado, o respeito às crenças e aos valores de todos os segmentos da sociedade é a prova de maturidade democrática, como, aliás, o constituinte colocou, no artigo 3º, inciso IV, da C.F, ao proibir qualquer espécie de discriminação.
*IVES GANDRA DA SILVA MARTINS, é advogado tributarista, professor e prestigiado jurista brasileiro; acadêmico das: Academia Internacional de Cultura Portuguesa, Academia Cristã de Letras e Academia de Letras da Faculdade de Direito da USP; Professor Emérito das universidades Mackenzie, CIEE/O, ECEME e Superior de Guerra - ESG; Professor Honorário das Universidades Austral (Argentina), San Martin de Porres (Peru) e Vasili Goldis (Romênia); Doutor Honoris Causa da Universidade de Craiova (Romênia) e Catedrático da Universidade do Minho (Portugal).

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Juramento de posse do primeiro-ministro da Espanha é feito novamente perante o crucifixo


Mariano Rajoy jura fidelidade ao cargo diante da bíblia e da constituição espanhola
Por Nieves San Martín
MADRI, quinta-feira, 22 de dezembro de 2011 (ZENIT.org) - Se os símbolos falam, o juramento de posse do novo presidente do Conselho de Ministros da Espanha, Mariano Rajoy, é uma declaração de intenções: o crucifixo volta a presidir a vida pública espanhola.
Mariano Rajoy fez o seu juramento de posse nesta quarta-feira (21) no palácio da Zarzuela, residência dos reis da Espanha, com a mão direita sobre a bíblia e um exemplar da Constituição de 1978. Na mesa, bem visível diante das câmeras, uma testemunha muda, mas eloquente: um crucifixo.
“Juro fielmente cumprir as minhas obrigações como presidente do governo com lealdade ao rei e à Constituição”. Com a mão sobre a bíblia e perante o crucifixo, Rajoy pronunciou estas palavras na presença do rei Juan Carlos I, às 11h, numa breve cerimônia, segundo fontes da Casa Real. Ele passa a ser o sexto presidente da democracia do século XX na Espanha, depois do debate parlamentar de investidura desta terça-feira, em que apresentou o seu programa de governo para obter a confiança do Congresso dos Deputados. Contando com maioria absoluta, 185 votos, o candidato garantiu a confiança do seu próprio partido e o apoio de outros dois.
O juramento foi acompanhado ainda pela rainha Sofia, pelo ex-presidente do governo, José Luis Zapatero, e pelos representantes principais das instituições espanholas.
O rei Juan Carlos I e o presidente do Congresso assinaram nesta terça-feira o real decreto de nomeação do novo chefe do Executivo espanhol, já publicado ontem (quarta-feira) no Boletim Oficial do Estado (BOE), equivalente ao Diário Oficial.
O nomeado para chefiar o governo da Espanha escolhe entre as modalidades juramento ou promessa. Rajoy escolheu fazer seu juramento de posse diante de um crucifixo, de um exemplar da Constituição aberto no título IV, sobre o Governo e a Administração, e de uma bíblia de 1791, dedicada ao rei Carlos IV, aberta no livro dos Números, capítulo XXX, sobre voto e juramento.
A mesma modalidade foi utilizada pelos ex-presidentes do governo espanhol Adolfo Suárez, Leopoldo Calvo-Sotelo e José María Aznar. Felipe González e José Luis Rodríguez Zapatero optaram pela promessa.


terça-feira, 20 de dezembro de 2011

A segunda grande onda evangelizadora



Acompanhe a segunda pregação de advento feita pelo frei Raniero Cantalamessa, OFMCap, pregador oficial da Casa Pontifícia.
NÃO HÁ MAIS GREGO OU JUDEU, BÁRBARO NEM CITA
A segunda grande onda evangelizadora após as invasões bárbaras
CIDADE DO VATICANO, terça-feira 13 dezembro, 2011 (ZENIT.org) - Oferecemos a seguir o texto da segunda Pregação do Advento 2011, realizada na sexta-feira de manhã, 9 de Dezembro, no Vaticano pelo Padre Raniero Cantalamessa, OFM Cap, pregador da Casa Pontifícia.

Nesta meditação, gostaria de falar da segunda grande onda de evangelização na história da Igreja, aquela que veio depois da queda do império romano e da mistura de povos que aconteceu com as invasões bárbaras. Nosso objetivo prático é ver o que podemos aprender para hoje. Diante da amplitude desse período histórico e da brevidade imposta por esta meditação, poderemos dar apenas algumas breves pinceladas.
1. Uma decisão de época
No fim oficial do império romano, em 476, a Europa já apresenta há tempos um rosto novo. No lugar do império único, temos reinos românico-bárbaros. Grosso modo, partindo do norte, a situação é esta: onde existiu a província romana da Bretanha, temos os anglos e os saxões; nas antigas províncias da Gália, os francos; a leste do Reno, os frísios e os alemães; na península ibérica, os visigodos; na Itália, os ostrogodos e depois os longobardos; no norte da África, os vândalos. E no Oriente ainda resiste o império bizantino.
A Igreja se vê diante de uma decisão de época: que postura adotar perante essa nova situação? Não foi rápido nem sem dilacerações que a Igreja chegou à determinação que a voltou para o futuro. Estava se repetindo, em certa medida, o que tinha acontecido no momento da separação do judaísmo para acolher os gentios na Igreja. A dissipação geral dos cristãos chegou ao clímax no saque de Roma, em 410, comandado pelo rei dos godos, Alarico. Pensava-se que tinha chegado a hora do fim do mundo, quando o mundo era identificado com o mundo romano, e o mundo romano com o cristianismo. São Jerônimo é a voz mais representativa dessa dissipação geral: “Quem teria acreditado que esta Roma, construída sobre vitórias que retumbaram pelo universo inteiro, haveria um dia de desabar?” (S. Jerônimo, Comentário a Ezequiel, III, 25, pref.).
Quem mais contribuiu, do ponto de vista intelectual, para rebocar a fé para o novo mundo foi Agostinho, com De civitate Dei. Na visão dele, que emoldura o começo de uma filosofia da história, é diferenciada a cidade de Deus da cidade terrena, identificada em alguns trechos, forçando um pouco o seu próprio pensamento, com a cidade do demônio. Por cidade terrena ele entende toda realização política, inclusive a de Roma. Portanto, não é nenhum fim do mundo, mas apenas o fim de um mundo.
Um papel determinante na abertura da fé para a nova realidade e na coordenação das iniciativas voltadas a ela foi desempenhado pelo pontífice romano, São Leão Magno. Ele tem uma consciência clara de que a Roma cristã sobreviverá à Roma pagã. Mais ainda: ela “presidirá o mundo, com a sua religião divina, mais amplamente do que teria presidido com a sua dominação terrena” (S. Leão Magno,Sermão 82).
Pouco a pouco, a postura dos cristãos quanto aos povos bárbaros muda. De seres inferiores, incapazes de civilidade, eles começam a ser considerados como possíveis futuros irmãos de fé. De ameaça permanente, o mundo bárbaro começa a ser visto pelos cristãos como um novo, vasto campo de missão. Paulo tinha proclamado abolidas, com Cristo, as distinções de raça, de religião, de cultura e de classe social, com as palavras “Não há mais grego nem judeu, circuncisão ou incircuncisão, bárbaro, cita, escravo, livre, mas apenas Cristo, em tudo e em todos” (Col 3,11). Mas que dificuldade para traduzir esta revolução na realidade da história! E não só naquele tempo.
2. A reevangelização da Europa
No tocante aos povos bárbaros, a Igreja viu-se em meio a duas batalhas. A primeira foi contra a heresia ariana. Muitas tribos bárbaras, em especial os godos, antes de penetrarem no coração do império como conquistadores tinham tido contatos no Oriente com o cristianismo, e o haviam acolhido na versão ariana, então no auge, por causa da obra do bispo Ulfila (311-383), que traduzira a bíblia para o gótico e vivera em meio àqueles povos. Quando se estabeleceram nos territórios ocidentais, eles trouxeram consigo essa versão herética do cristianismo.
O arianismo não tinha, no entanto, uma organização unitária, nem uma cultura e uma teologia comparável com a católica. No século VI, um depois do outro, os reinos bárbaros abandonaram o arianismo para aderir à fé católica, graças ao trabalho de grandes bispos e escritores católicos, e, algumas vezes, de cálculos políticos. Um momento decisivo foi o concílio de Toledo, em 589, com Leandro de Sevilha, que marcou o fim do arianismo visigótico na Espanha e, na prática, no ocidente inteiro.
Mas a batalha contra o arianismo não era coisa nova. Tinha começado no distante ano de 325. A verdadeira nova empreitada realizada pela Igreja depois do ocaso do império romano foi a evangelização dos pagãos. Ela aconteceu em dois sentidos: ad intra e ad extra, por dizer assim, ou seja, tanto junto aos povos do antigo império quanto junto aos povos que tinham recém-entrado em cena. Nos territórios do império velho, Itália e províncias, a Igreja estava implantada até aquele momento quase só nas cidades. Ela precisava estender a sua presença para o interior, para os vilarejos. O termo “pagão” deriva, como se sabe, de “pagus”, vilarejo, e assumiu o significado que tem hoje do fato de que a evangelização do interior ocorreu em geral bem depois da evangelização urbana.
Seria interessante, certamente, seguirmos este filão da evangelização que levou ao nascimento e ao desenvolvimento do sistema das paróquias, como subdivisões da diocese, mas, dentro da meta que eu me dei para agora, preciso me limitar à outra direção que também foi seguida pela evangelização: a direção ad extra, destinada a levar o Evangelho para os povos bárbaros que tinham se firmado na Europa insular e central, isto é, nas atuais Inglaterra, Holanda, França e Alemanha.
Um momento decisivo nesta empreitada foi a conversão do rei merovíngio Clodoveu, que, na noite de Natal de 498, ou 499, se deixou batizar pelo bispo de Reims, São Remígio. Ele decidiu, com isso, de acordo com os costumes daquele tempo, não apenas o futuro religioso do povo franco, mas também o dos outros povos de cá e de lá do Reno, conquistados por ele. É célebre a frase do bispo Remígio no momento de batizar Clodoveu: “Mitis depone colla, Sigamber; adora quod incendisti, incende quod adorasti”. “Inclina humildemente a nuca, Sigambro altivo; adora o que tu queimavas, queima o que tu adoravas” (Gregório de Tours, Historia Francorum,  II, 31). A este acontecimento é que a França deve o título de “filha primogênita da Igreja”.
A cristianização do continente foi levada em frente no século IX com a obra dos santos Cirilo e Metódio, que converteram os povos eslavos assentados na Europa oriental, nos territórios deixados para trás durante as ondas migratórias anteriores, que se deslocavam para o ocidente.
A evangelização dos bárbaros apresentava uma nova situação se comparada à do mundo greco-romano. Antes, o cristianismo tinha por diante um mundo culto, organizado, com regras, leis, línguas comuns; havia, enfim, uma cultura com a qual dialogar e com a qual confrontar-se. Agora, ele tem que cumprir ao mesmo tempo uma obra de civilização e de evangelização; tem que ensinar a ler e escrever, enquanto ensina a doutrina cristã. A inculturação se apresenta de um jeito inteiramente novo.
3. A epopeia monástica
A obra gigantesca que eu pincelei aqui foi realizada com a participação de todos os componentes da Igreja. Em primeiro lugar, o papa, a cuja iniciativa direta remonta a evangelização dos anglos, e que teve uma participação ativa na evangelização da Alemanha por obra de São Bonifácio e dos povos eslavos pelo trabalho de São Cirilo e São Metódio. Depois, os bispos, os párocos, que aos poucos foram formando comunidades locais estáveis. Um papel silencioso, mas decisivo, foi desempenhado por algumas mulheres. Por trás de algumas grandes conversões de reis bárbaros esteve o ascendente exercido pelas respectivas esposas: Santa Clotilde para Clodoveu, Santa Teodolinda para o rei longobardo Autari, a esposa católica do rei Edvino, que levou o cristianismo para o norte da Inglaterra.
Mas os verdadeiros protagonistas da reevangelização da Europa depois das invasões bárbaras foram os monges. No Ocidente, o monacato começado no século IV se difundiu rapidamente em duas épocas e em dois sentidos diferentes. A primeira onda partiu da Gália meridional e central, especialmente das ilhas Lérins (410) e da região de Auxerre (418), e, graças a São Patrício, formado naqueles dois centros, chegou até a Irlanda, onde fecundou a vida religiosa inteira da ilha. De lá, passou para a Escócia e para a Inglaterra num primeiro momento e, depois, voltou rumo ao continente.
A segunda onda, destinada a unificar as diversas formas de vida monástica ocidental, surge na Itália de São Bento (+547). Do século V ao VIII, a Europa se recobre literalmente de mosteiros, muitos deles de importância essencial na formação do continente, não apenas na fé, mas também na arte, na cultura e na agricultura. Não foi à toa que São Bento foi proclamado Padroeiro da Europa, e que o papa escolheu Subiaco, em 2005, para o seu discurso magistral sobre as raízes cristãs da Europa.
As grandes figuras dos monges evangelizadores pertencem quase todas à primeira das duas correntes que recordamos aqui, aquela que retorna ao continente via Irlanda e Inglaterra. Os nomes mais representativos são os de São Columbano e São Bonifácio. O primeiro, partindo de Luxeuil, evangelizou numerosas regiões do norte da Gália e as tribos germânicas meridionais, chegando até Bobbio, na Itália. O segundo, considerado o evangelizador da Alemanha, estendeu a partir de Fulda uma ação missionária que atingiu a Frísia, atual Holanda. O Santo Padre Bento XVI dedicou a ele uma das suas catequeses de quarta-feira, a de 11 de março de 2009, enfatizando a colaboração estreita com o Romano Pontífice e a ação civilizadora no seio dos povos que Bonifácio evangelizou.
Ao lermos suas vidas, temos a impressão de reviver a aventura missionária do apóstolo Paulo. A mesma ânsia de levar o evangelho a toda criatura, a mesma coragem de enfrentar toda sorte de perigos e reveses, e, para São Bonifácio e tantos outros, a mesma sorte final do martírio.
As lacunas dessa evangelização vasta são conhecidas. O próprio confronto com São Paulo põe as principais delas em destaque. O apóstolo, junto com a evangelização, procurava em todo lugar fundar uma igreja que assegurasse a sua continuidade e desenvolvimento. Era frequente, por carência de meios e pela dificuldade de locomoção dentro de uma sociedade ainda rudimentar, que aqueles pioneiros não conseguissem garantir um seguimento da própria obra.
Do programa indicado por São Remígio a Clodoveu, os povos bárbaros tendiam a pôr em prática só uma parte. Adoravam o que tinham queimado, mas não queimavam o que tinham adorado. Grande parte da bagagem idólatra e pagã permanecia presente e se mostrava na primeira oportunidade. Ocorria o que acontece com algumas estradas abertas na floresta: sem manutenção e com pouco tráfego, a selva as invade em pouco tempo. A obra mais duradoura desses grandes evangelizadores foi justamente a fundação de uma rede de mosteiros, e, com Agostinho na Inglaterra e São Bonifácio na Alemanha, a criação de dioceses e a celebração de sínodos que garantiam a continuação de uma evangelização mais estável e profunda.
4. Missão e contemplação
Agora vamos procurar encontrar alguma indicação para hoje nesse quadro histórico que traçamos. Notemos primeiro uma certa analogia entre a época que revisitamos e a situação atual. O movimento, naquele tempo, ia de Leste para Oeste, e agora é de Sul para Norte. A Igreja, com o seu magistério, também neste caso fez uma escolha de campo, que é de abertura para o que é novo e de acolhimento dos novos povos.
A diferença é que hoje não estão chegando à Europa povo pagãos ou hereges cristãos, mas povos que possuem uma religião bem constituída e consciente de si mesma. O fato novo é o diálogo que não se opõe à evangelização, mas determina o seu estilo. O beato João Paulo II, na encíclica Redemptoris Missio, sobre a validade perene do mandado missionário, se expressou com clareza a este respeito: “O diálogo inter-religioso faz parte da missão evangelizadora da Igreja. Entendido como método e meio para um conhecimento e enriquecimento recíproco, ele não está em contraposição com a missão ad gentes; antes, tem com ela vínculos especiais e é dela uma expressão. À luz da economia da salvação, a Igreja não vê contraste entre o anúncio de Cristo e o diálogo inter-religioso. Ela sente, porém, a necessidade de compô-los no âmbito da sua missão ad gentes. É necessário que estes dois elementos mantenham seu vínculo íntimo, e, ao mesmo tempo, a sua distinção, pela qual não se confundem, não se instrumentalizam e não são julgados como equivalentes, como se fossem intercambiáveis” (João Paulo II, Redemptoris Missio, 55).
O que aconteceu na Europa depois das invasões bárbaras nos mostra, acima de tudo, a importância da vida contemplativa para a evangelização. O decreto conciliar Ad gentes, sobre a atividade missionária da Igreja, escreve: “Merecem especial consideração as várias iniciativas destinadas a estabelecer a vida contemplativa. Alguns institutos, mantendo os elementos essenciais da instituição monástica, tendem a implantar a riquíssima tradição da própria ordem; outros procuram voltar à simplicidade das formas do monacato primitivo. Todos, porém, devem buscar uma real adaptação às condições locais. A vida contemplativa implica a presença eclesial na sua forma mais plena: por isso é preciso que ela seja constituída em toda parte nas jovens Igrejas” (L.G., 18).
Este convite a procurar novas formas de vida monástica para fins de evangelização, mesmo inspirando-se no monacato antigo, não ficou sem ser ouvido.
Uma das formas de realização desse auspício são as Fraternidades Monásticas de Jerusalém, conhecidas como “os monges e freiras de cidade”. Seu fundador, padre Pierre-Marie Delfieux, depois de dois anos no deserto do Saara em companhia somente da Eucaristia e da bíblia, entendeu que o verdadeiro deserto são hoje as grandes cidades secularizadas. Iniciadas em Paris na festa de Todos os Santos de 1975, essas fraternidades já estão presentes em várias grandes cidades da Europa, inclusive Roma, onde assumiram a igreja de Trinità dei Monti. O carisma deles é evangelizar através da beleza da arte e da liturgia. Seu hábito é monástico, seu estilo de vida é simples e austero, há o vínculo entre trabalho e oração; mas é nova a sua colocação no centro das cidades, geralmente em igrejas antigas de grande reclame artístico, a colaboração entre monges e freiras no âmbito litúrgico, sem deixar de haver uma total independência recíproca em habitação e autoridade. Não foram poucas as conversões de pessoas distantes, nem as voltas de cristãos “de nome” para a fé praticada, graças a esses locais.
De outro gênero, mas também participando nessa nova florada de formas monásticas, é o mosteiro de Bose, na Itália. No ecumenismo, o mosteiro de Taizé, na França, é um exemplo de vida contemplativa diretamente comprometida com a evangelização.
Em 1º de novembro de 1982, em Ávila, acolhendo uma vasta representação da vida contemplativa feminina, João Paulo II prospectou até mesmo para a vida de clausula das freiras a possibilidade de um envolvimento mais direto na obra da evangelização.
“Seus conventos”, disse ele, “são comunidades de oração em meio às comunidades cristãs, às quais vocês dão ajuda, alimento e esperança. São lugares consagrados e poderão ser ainda centros de acolhimento cristão para aquelas pessoas, particularmente os jovens, que tantas vezes estão em busca de uma vida simples e transparente, em contraste com a vida que é oferecida a eles pela sociedade do consumo”.
O apelo não passou em branco e está se traduzindo em iniciativas originais de vida contemplativa feminina aberta à evangelização. Uma delas se tornou conhecida no recente congresso promovido aqui no Vaticano pelo Pontifício Conselho para a Nova Evangelização. Essas formas novas não substituem as realidades monásticas tradicionais, muitas das quais também são centros de irradiação espiritual e de evangelização, mas se juntam a elas e as enriquecem.
Não basta que na Igreja exista quem se dedica à contemplação e quem à missão. Precisamos que a síntese entre as duas coisas aconteça na vida de cada missionário. Não basta, em outras palavras, a oração “pelos” missionários: precisamos da oração “dos” missionários. Os grandes monges que reevangelizaram a Europa depois das invasões bárbaras eram homens saídos do silêncio da contemplação e que voltavam a ela tão logo as circunstâncias permitiam. Mais ainda: no coração, eles nunca saíam do mosteiro. Colocavam em prática, por antecipação, o conselho que Francisco de Assis daria aos seus frades quando os enviasse às estradas do mundo: “Nós temos uma ermida sempre conosco, onde quer que estejamos, e, toda vez que quisermos, podemos voltar para dentro dela, como eremitas. O irmão corpo é a ermida e a alma é o eremita que a habita para falar com Deus e meditar” (Legenda Perugina, 80 - FF, 1636).
Temos disso um exemplo de muito mais autoridade. A jornada de Jesus era um entrecruzar-se admirável de oração e pregação. Ele não rezava apenas antes de pregar, mas rezava para saber o que pregar, para buscar na oração o que anunciar ao mundo. “O que digo, é como o Pai o disse a mim” (Jo 12,50). Era dali que surgia em Jesus a “autoridade” que tanto impressionava em seu falar.
O esforço por uma nova evangelização está exposto a dois perigos. Um deles é a inércia, a preguiça, o não fazer nada e deixar que os outros façam tudo. E o outro é se lançar num ativismo humano febril e vazio, com o resultado de perder pouco a pouco o contato com a fonte da palavra e da sua eficácia. Mas como ficar tranquilos pregando enquanto tantas exigências reclamam a nossa presença? Como não correr enquanto a casa está pegando fogo? Imaginemos o que aconteceria com um corpo de bombeiros que corresse para apagar um incêndio e, quando chegasse ao local, percebesse que não trouxe nos reservatórios nenhuma gota d’água. Somos nós, quando corremos para pregar sem rezar.
A oração é essencial para a evangelização porque “a pregação cristã não é primariamente comunicação de doutrina, mas de existência”. Faz mais evangelização quem reza sem falar do que quem fala sem rezar.
5. Maria, estrela da evangelização
Terminemos com um pensamento sugerido pelo tempo litúrgico que estamos vivendo e pela solenidade da Imaculada Conceição. Uma vez, num diálogo ecumênico, um irmão protestante me perguntou, sem polêmicas, apenas para entender: “Por que vocês, católicos, dizem que Maria é a estrela da evangelização? O que ela fez para justificar esse título?”. Para mim, foi a ocasião de refletir, e eu não demorei a encontrar a razão profunda. Maria é a estrela da evangelização porque ela trouxe a Palavra não para este ou para aquele povo, mas para o mundo inteiro!
E não só por isso. Ela carregou a Palavra no ventre, não na boca. Estava cheia, fisicamente inclusive, de Cristo, e o irradiava com sua simples presença. Jesus lhe saía dos olhos, do rosto, de toda a pessoa. Quando nos perfumamos, não precisamos avisar. Basta estar perto. Maria, especialmente no tempo em que trazia Jesus no ventre, estava cheia do perfume de Cristo.
Podemos dizer que Maria foi a primeira consagrada de clausura da Igreja. Depois do Pentecostes, ela como que entrou em clausura. Através das cartas dos apóstolos, conhecemos inúmeras personagens, entre elas tantas mulheres, da primitiva comunidade cristã. E achamos menção a uma certa Maria (cf. Rom 16,6), mas não é ela. De Maria, a Mãe de Jesus, nada. Ela desaparece no mais profundo silêncio. Mas o que significou para João tê-la ao lado enquanto escrevia o Evangelho e o que pode significar para nós tê-la ao lado enquanto proclamamos o mesmo Evangelho! “Primícias dos Evangelhos”, escreve Orígenes, “é o de João, cujo sentido profundo não se pode perceber sem se ter apoiado a cabeça no peito de Jesus nem se ter recebido dele Maria como própria mãe” (Orígenes, Comentário a João, I, 6,23).
Maria inaugurou na Igreja uma segunda alma, ou vocação, que é a alma escondida e orante, junto com a alma apostólica ou ativa. É o que exprime com louvor o ícone tradicional da Ascensão, da qual temos no lado direito desta capela uma representação. Maria está em pé, com os braços abertos em espera orante. Em torno dela, os apóstolos, todos com um pé ou mão elevada, em movimento, representando a Igreja ativa, que está em missão, que fala e age. Maria está imóvel abaixo de Jesus, no ponto exato de onde ele ascendeu, quase como mantendo viva a memória dele e a espera pelo seu retorno.
Encerremos ouvindo as palavras finais da Evangelii Nuntiandi, de Paulo VI, que pela primeira vez nos documentos pontifícios chama Maria de estrela da evangelização: “Na manhã de Pentecostes, Ela presidiu com a oração o início da evangelização sob a ação do Espírito Santo. Seja ela a estrela da evangelização sempre renovada que a Igreja, dócil ao mandado do Senhor, deve promover e cumprir, particularmente nestes tempos difíceis, mas cheios de esperança!”.